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terça-feira, junho 03, 2014

“Fez mais por mim do que Jesus” – Japão/Coréia 2002 

Mas iremos achar o tom Um acorde com um lindo som E fazer com que fique bom Outra vez, o nosso cantar E a gente vai ser feliz Olha nós outra vez no ar O Show Tem Que Continuar... 2002 é até hoje um dos três melhores anos da minha vida. Tudo aconteceu, tudo deu certo. Havia me formado na faculdade em dezembro de 2001, planejava morar e trabalhar fora do Brasil por um ano e tinha total consciência que entrava em uma fase mágica. Vivia em paz e me divertia como nunca. O plano de morar fora foi levado a sério. O desejo original era Barcelona e o destino final foi Greenfield, New Hampshire, EUA. 600 (sim, seicentos) habitantes e invernos com trinta abaixo de zero. Recebi a carta formalizando a oferta da empresa dia 19/3, o que me deixou feliz e preocupado ao mesmo tempo. A empresa queria que eu começasse dia 22 de abril e nao existia a menor possibilidade de eu não assistir à Copa no Brasil. Enrolei o que pude e abril passou. Culpei a burocracia brasileira e maio se foi. No início de junho recebi um ultimato: se não começasse até 1/7 eu perdia a vaga. Topei. O mundial do Japão e da Coréia acabaria dia 30/6, comprei minha passage São Paulo-Boston pro mesmo dia. Sim, estiquei a corda. A menos de três meses da estreia era impossível fazer qualquer prognostico sobre o desempenho do Brasil na Copa. A seleção batera no fundo do poço em 2001, com Leomar em campo e Candinho (sucedendo Leão que sucedera Luxemburgo!) no comando. A chegada de Felipão não aliviou as coisas e o Brasil conseguiu a façanha de ser eliminado(merecidamente) por Honduras nas quartas de final da Copa América da Colômbia, vi este jogo no Playball da Pompeia. Rivaldo estava baleado e Ronaldo, aleijado.Aos trancos e barrancos, chegamos ao ultimo jogo das eliminatórias precisando ganhar da Venezuela para nos classificarmos. As vacas estavam tão magras que o jogo foi tenso mas passamos com 2 gols de Luizão, que saiu batendo no peito e foi abraçar Felipão nas comemorações. Nascia ali o embrião da família Scolari. O perrengue une. Retrato do desespero que tomou conta de todos, lembro que uma capa de Placar antes do mundial falava que as esperanças do país estava nos ombros de um jogador fora de atividade há 2 anos (Ronaldo Nazário, como Felipão chamava o Fenômeno) e um atacante de 36 anos que não primava exatamente pelo esmero no cuidado com a própria conducao física (Romário). O Baixinho estava em baixa pois reza a lenda que tinha pedido dispensa da seleção justamente na estreia de Felipão nas eliminatórias contra o Uruguai em Montevideo. Disse que precisava operar a vista e teria sido flagrado na balada poucos dias depois. Classic. Mas como jogava muita bola e Felipão tem coração mole, quase dobrou o homem ao fazer um depoimento em que chorou e pediu pra ser convocado em entrevista coletiva. Só não o fez porque, segundo outra lenda, Felipão teria descoberto que a coletiva fora organizada por Don Eurico Miranda e que o choro seria falso. Desta forma, peitou a opinião pública e preferiu convocar vários atacantes que roeram o osso nas eliminatórias como Edílson e Luizão. Pois bem, voltando à minha saga, a partir de 19/3 tinha entrado em clima de bota-fora e comecei a me desfazer de uma séria de coisas. Ao fuçar na internet descobri que tinha uns tais pontos Dotz que não serviam pra muita coisa mas que me permitiam resgatar um CD. Escolhi um tal de “Puro Suingue” de Jorge Ben e esta acabou sendo boa parte da trilha sonora daquele mundial. Aquela maneira arrastada e caricata do cara cantar transportava a gente direto pros anos 70 e nos fazia sonhar que a Copa seria tão generosa conosco quanto o primeiro mundial do México tinha sido pra geração dos nossos pais (eu tinha 22 anos em 2002 e minha mãe, 19 em 1970). Eu já padecia da mesma “ansiedade pré-Copa” que me acomete hoje e escrevia uns textos de futebol pra ver se o tempo passava mais rápido. Curiosamente, dei uma olhada no meu blog, que anda bastante empoeirado e vi que o ultimo texto foi escrito em 2 de julho de 2010 justamente sobre Brasil x Holanda. Lá se vão quatro anos sem escrever. Contando os textos que penso em fazer antes e durante a Copa, o blog ultrapssará a marca de 100 artigos e crônicas. Ao invés de compartilhar na web, minha ideia é separar os 20-30 melhores textos e imprimir um par de livros pro Leo e a Olívia lerem daqui uns anos. Finalmente 31/5/2002 chegou e com ele duas coisas mágicas: fui para meus últimos jogos universitários na vida (Magrão e eu) e a maldita da França abriu a Copa dando papelão diante de Senegal com Zidane se arrastando em campo. Fazia um frio de rachar, tínhamos dormido no carro e colocado despertador pra 06h00 pra acordar e ver o jogo numa padaria. As coisas começavam bem. Dormir no carro por quatro dias no interior de SP em pleno inverno é complicado até quando você tem 22 anos. Sendo assim Magro e eu saímos em busca de algum lugar pra dormir (o mais barato possível) e encontramos uma velha pilantra que alugou pra gente o quarto de um estudante na casa dela. O moleque tinha viajado para encontrar os pais e topamos na hora. A combinação de ver jogos em padarias e beber cerveja as 06h30 da manhã era estranha no começo mas depois de dois dias se incorporou à nossa rotina. Assim vimos a Argentina ganhar de 1x0 (Batistuta) da Nigéria no bar do Claudinho (uma tremeda bicha, a propósito), o Uruguai perder da Dinamarca e a Inglaterra empatar com a Suécia. Ver jogos da Copa de manhã, curtir os jogos universitários à tarde e à noite. Era uma rotina difícil. Dia 2 de junho voltamos para São Paulo à noite. Os sinais luminosos da Estrada desejavam boa sorte à seleção ao invés de informar acidentes e pontos de tráfego. Chegamos em casa e dormir era praticamente impossível. Acordei às 05h00 e chamei o Magrão pra vermos o jogo duro contra a Turquia, com direito a Ronaldo mostrando que tinha fome, Rivaldo simulando agressão e o juizão marcando penalti escandaloso em falta fora da area em Luizão. Milton Neves continuava repetindo que o Brasil venceria os sete jogos de junho mas o primeiro jogo deixava claro que aquele Copa teria muita emoção. O samba puxado por Ronaldinho Gaúcho no onibus da seleção após os jogos passou a fazer companhia lá em casa ao CD do Jorge Ben. Veio o jogo da China e fomos pra cobertura dos pais do Fernando, cunhado do Guto. Jogo tranquilo, gols dos 4Rs e churrasco com baladinha na sequencia.O grupo do Brasil era uma baba a ponto de no jogo seguinte eu ter aberto uma exceção: ver jogo do Brasil em Copa na balada. Era aniversário do Magro, fomos pro Image e vimos a pelada contra a Costa Rica. Tão pelada que o Brasil jogou de shorts branco, o Edmílson fez gol de meia bicicleta e o Junior formiga foi eleito o melhor em campo. De quebra, cruzei o Pedro Pavan na balada, um grande amigo que eu não via desde 94 e que nunca mais vi depois disso. Deve ter sido um sinal. As coisas começaram a melhorar e as temidas França e Argentina morreram na 1a fase. Além disso o chaveamento tinha parecia ter sido camarada e reservou um jogo contra a Bélgica nas 8as pra gente. Parecia mas não foi. Nunca estivemos tão perto da eliminação naquele mundial quanto no jogo contra a Bélgica em que Marcos pegou tudo e o apito amigo voltou a jogar do nosso lado (gol legítimos dos caras mal anulado). 2x0 enganoso com gols de Rivaldo e Ronaldo e Kléberson entrando pra arrumar o time (tal e qual Mazinho em 94). Mais uma vez ficava a impressão de que seria muito improvável que aqueles dois monstros jogassem mal no mesmo dia. Enquanto isso a sorte continuava a soprar a nosso favor com a Itália sendo absurdamente garfada contra a Coréia, lembro que vi este jogo meio escondido na sala do helpdesk da SAP. 20 de junho foi meu ultimo dia de trabalho na SAP, decidi usar os ultimo dez dias no Brasil pra resolver algumas funções da mudança e ver a copa do mundo em paz. A começar pelo Brasil x Inglaterra na madrugada seguinte. Saímos da balada (Morisson na Vila Madalena se não me falha a memória) pra vermos o jogo na casa do Magrão. Acredite se quiser mas o Tadeu dormiu no 1o tempo, não viu a cagada do Lúcio no gol do Owen e só acordou com a gente esmurrando a veneziana no gol de empate do Rivaldo em finalização genial de corpo invertido após arrancada fantástica do Gaúcho. Gaúcho este que faria gol espírita logo no início do segundo tempo e seria expulso pra deixar o jogo dramático. Fomos pra rua comemorar mas o negócio estava devagar, as pessoas claramente não estavam dando o valor merecido à Copa. Àquela altura o único grande que tinha sobrado era a Alemanha uma vez que o apito amigo deu as graças de novo e fez da Espanha a mais nova vítima da Coréia. Assisti à semifinal contra a Turquia na casa da MS. Jogo modorrento e Ronaldo com corte de cabelo de Cascão fazendo gol de bico só pra gente matar a saudade do Romário contra a Suécia em 94. Estávamos na final e nada ou ninguém poderia tirar aquele título da gente. Vendi meu carro e fiz minhas malas enquanto esperava a final que parecia não chegar nunca. No dia do jogo acordei às 04h00, liguei pro Guto e combinamos de chegar no Fernando antes da hora combinada. Acordamos o cara às 06h00 e abrimos a primeira cerveja para combater aquela ansiedade maldita. Reservamos um lugar bem perto da TV pois naquele dia a expectativa era de casa cheia. 1o tempo mais complicado do que o esperado, jogo igual, Marcão salvando e bola na trave pros caras. Em alguns flashes, lembro do Ronaldinho estar bem e do Ronaldo ter perdido um gol. No 2o tempo nos impusemos e Ronaldo fez as vezes do messias da vez. Depois do segundo gol não aguentei e gritei, para reprovação das meninas presents, que aquele cara já tinha feito mais por mim do que Jesus. No final do jogo estávamos ajoelhados chorando, principalmente o Tadeu que tinha perdido o pai dois meses antes. Emendamos um churrasco ali mesmo, de lá fomos pra Faria Lima (outro flash: vi o ex-árbitro Godoy mamado dentro do Tipuana) comemorar a felicidade plena de sermos os melhores do mundo na coisa mais importante da vida. O dia que nunca deveria ter acabado chegava ao fim. Passei em casa, peguei minhas coisas e fui de carona com o Juan pra Cumbica. Dormi antes mesmo do avião decolar e so acordei com ele batendo no chão. A United perdeu minhas malas e finalmente conheci o Kevin Harte do RH da empresa que quase me dspensou antes de me contratar. Ao me conhecer o Kevin disse que tinha gravado vários jogos da Copa, tenho estas fitas K7 em casa até hoje. 2002 foi nossa Copa de 70. Juventude, craques (o passar do tempo porá Ronaldo no nível de Garrincha e Roberto Carlos no de Nilton Santos, não tenha dúvida), campanha impecável e felicidade absoluta. Na memória a lembrança de um ano perfeito.

“O dia em que Deus morreu” – França 98 

1998 seria um ano inesquecível. 18 anos, entrando na faculdade, Copa do Mundo com Romário e Ronaldo. Não conseguia imaginar a vida muito melhor do que aquilo. Tinha passado bem no vestibular e por volta de março fui surpreendido por uma pergunta da minha mãe: “olha, voce fez 18 anos e passou na faculdade. Vou lhe dar um presente e voce tem duas opções: um carro popular zero km ou um pacote pra ver os jogos do Brasil na 2a fase da Copa da França. O que vai ser?” Que pergunta mais sem sentido. Quando percebi estávamos na Agaxtur da avenida Europa fechando o pacote com ingressos para 4 jogos em 3 semanas de viagem. O custo da viagem era o mesmo do carro. Um mundial na França era praticamente um torneio disputado em campo neutro, afinal os donos da casa tinham ficado de fora das duas últimas Copas. E com a dupla Romário e Ronaldo, do passe de peito e três gols cada na final da Copa das Confederações de 97, com Roberto Carlos e seu gol desafiando a física contra a França no quadrangular antes da Copa, nada poderia segurar o Brasil. Bem, talvez a panturrilha contundida do Baixinho pudesse. Lembro-me como se fosse ontem (estava no bar da faculdade) da coletiva em que ele chorava feito criança enquanto seu corte era anunciado pela comissão técnica, Dr Lídio Toledo à frente. Da mesma forma como está fresca na memória a lembrança do craque se recuperando pelo Flamengo a ponto de jogar um amistoso e anotar um gol contra o Inter durante a Copa. Bola pra frente. Na abertura da Copa vi em casa um jogo morno contra a Escócia, com direito a um gol bizarro do Cafu (na súmula o árbitro deu gol contra). A culpa era da famosa tensão da estreia. Antes da partida contra o Marrocos fui às compras na 25 de março e fiz a festa. A parte mais importante da mala pra França estava garantida.O jogo em si foi tranquilo e valeu pelo fato do Ronaldo ter desencantado. Veio o terceiro jogo (mesmo dia da morte do cantor Leonardo) e com ele a lembrança de um conceito que pra mim explica muita coisa no futebol: não importa a diferença técnica entre as equipes, e sim o encaixe entre os estilos de jogo. E contra a Noruega o jogo do Brasil simplesmente não encaixa. Derrota merecida e de virada por 2x1 e déjà vu do Brasil x Suécia (o jogo que a crítica chamou de “bisonho”) de 94. Brasil passou em 1o no grupo, o desempenho mediano não importava tanto porque sabemos que Copa não tem a menor lógica. Dias depois eu pisava na Europa pela 1a vez. Jamais vou me esquecer da cara da minha mãe olhando pra minha na saída do metro na Place de La Concorde. Paris era ainda mais linda do que eu imaginava e o chaveamento tinha sido camarada o suficiente para colocar o Chile de Zamorano e Salas no caminho do Brasil nas oitavas. Fomos ao Parque dos Príncipes e a primeira coisa que me chamou a atenção foram os torcedores de sofá: querem ver o jogo sentados, não falam palavrão e dão a impressão que o jogo é um mero detalhe. A partida em si correu como eu esperava: fácil, afinal de contas o estilo de jogo dos chilenos era, é e sempre será muito compatível com o nosso. Dois gols de César Sampaio e dois de Ronaldo. Na saída do estádio tínhamos certeza que o adversário nas 4as seria a Nigéria pois naquela época ainda se acreditava em seleção africana. Paris era mesmo um lugar divertido. Estávamos no Ibis Montmartre (minha mãe pediu pra mudar de hotel porque o nosso ficava literalmente do lado de um cemitério), perto dos cabarés e de uns escoceses que andavam sem cueca e passavam o dia inteiro bêbados. Antes do jogo das 4as (sim, a Dinamarca enfiou uma sacolada na Nigéria) tive tempo de ir num show de música brasileira em Paris e de fazer uma viagem curta pra Bélgica. O jogo das 4as foi num estádio antigo e acanhado em Nantes. Chegamos cedo e pude acompanhar pelo rádio do segurança do estádio a França passar pela Itália nos pênaltis. Quando vi a atitude entojada do cara depois que o país dele se classificou pras semifinais tive a convicção de que aquele povo triste não merecia ganhar a Copa. O jogo em si foi mais emocionante que o anterior, quase uma pelada em que o Rivaldo decidiu pra gente. Eu olhava pro campo e pensava que era muito difícil Ronaldo e Rivaldo estarem mal no mesmo dia. Um dos dois sempre decidiria o jogo pra gente. Saímos do estádio cantando que a Argentina podia espera pois a hora deles ia chegar. Chegou mas chegou contra a Holanda. Eu andava com a minha mãe em Paris mas não resisti e entrei num pub cheio de argentinos pra acompanhar o final do jogo. Berkcamp mata o lançamento de Frank de Boer de uma maneira espetacular e fulmina a Argentina no ultimo minuto. Que coisa linda. Começo a gritar de felicidade, os argentinos me olham feio e eu corro pro banheiro do pub pra comemorar em paz. Entre as 4as e as semis demos um pulo em Londres e curtimos um pouco mais Paris: túmulo do Napoleão em Les Invalides, Museu Rodin, Musée d’Orsay. Trem bala para Marseille para nos depararmos com um lado diferente da França: sujeira, ambiente portuário, tinha mais cara de África do que de Europa. O jogo mais emocionante que assisti no estádio na minha vida o foi em grande parte por causa do lateral direito escalado pelo Zagalo naquele dia: o glorioso Zé Carlos cuja maior demonstração de talento era a imitação perfeita de papagaio na concentração. A gente estava muito perto do campo, o cara estava visivelmente desesperado no jogo e a todo momento parecia que a Holanda ia marcar um gol nas costas dele. O 2o tempo foi um jogaço, com o Ronaldo arrebentando mas perdendo a chance de matar o jogo antes de Kluivert subir 5m pra fazer de cabeça enquanto o saudoso Junior Baiano parecia chumbado no chão. Vieram os pênaltis e confesso que não vi o Zagallo histérico à beira do gramado motivando os batedores. Pensei em 94 e ajoelhei na arquibancada (os penaltis foram cobrados do lado oposto ao que a gente estava). Taffarel repetiu 94 e salvou a gente. Só me lembro de chorar, olhar pro lado e ver dois caras vestidos de freira ajoelhados e chorando do meu lado. Saí do estádio com dor de cabeça. Não sou exatamente uma pessoa de fé mas rezava muito. No fundo sabia que o time não estava bem e me apeguei a promessas religiosas para ganharmos a copa. Lembro que ficava quase uma hora rezando na cama depois que minha mãe apagava as luzes do quarto. Pensava que se deus existisse ele atenderia minhas preces. Como estávamos no Sul da França, decidimos ir pra Itália fazendo algumas paradas na costa, sendo Mônaco uma delas. Fomos descendo até Roma e a cada chance que tinha eu perguntava aos italianos quem ia ganhar a copa. Mais do que me responder, eles me pediam pro Brasil ganhar porque ninguém na Europa suportava os franceses. Voltamos a Paris e soubemos do escândalo dos ingressos falsos distribídos para clientes da agência de viagem que monopolizara a venda dos bilhetes. Por sorte o lote enviado ao nosso hotel (o pedido da minha mãe pra mudar de hotel não foi atendido) era legítimo e conseguimos ir pro jogo. Subúrbio de Paris, lugar horrível pra chegar mas estádio novinho em folha. Na arquibancada uns cariocas do grupo me falaram que o Edmundo ia jogar. Dei risada e não dei a menor bola, era simplesmente impossível o Ronaldo ficar de fora do jogo depois de tudo que tinha feito contra a Holanda. O Brasil entrou em campo em marcha lenta, o jogo não fluía e o 2o gol aos 46 do 1o tempo matou o Brasil. O nosso jogo não encaixava com o dos caras. Na longa volta de onibus do estádio pro hotel os torcedores de sofa tiveram a atitude vira-lata de abrir as janelas e aplaudir os franceses que buzinavam nas ruas. Deste ponto em diante eu me lembro de muito pouco, é como se fosse um trauma que gera um borrão na memória. Lembro-me que não dormi direito, que estava catatônico no dia seguinte, que minha mãe me comprou, em vão, um par de óculos escuros pra me animar. Lembro que tive certeza que deus, do jeito que eu conhecia até então, tinha morrido.

“A perda da virgindade” – EUA 94 

A proximidade da Copa de 2014 tem me deixado ansioso e ao mesmo tempo saudosista. Como é difícil gerenciar a primeira, decidi exercitar o saudosismo e escrever sobre os mundiais que mais me marcaram. Todos de que consigo me lembrar. Apesar de já estar com 10 anos, não incluo a Copa de 90 na categoria “memorável”. Recordo-me de alguns “flashes”: o bafo com as figurinhas no colégio, a animação utilizada pelo SBT na transmissão dos (poucos) gols do Brasil, a preocupação quando a claudicante campanha dos argentinos os colocou na nossa rota já nas 8as, os gols perdidos por Muller & Cia naquele dia fatídico em que minha mãe resolveu organizar uma festa em casa para assistirmos ao jogo. Talvez seja isso, quem faz festinha em casa em dia de jogo decisivo e deixa a TV praticamente no mudo não merece ganhar o mundial. Não merece sequer se lembrar dele com clareza. 94 foi diferente. A tensão começou nas eliminatórias. Derrota pra Bolívia em La Paz com frango do Taffarel. Ressureição em Recife ante a mesma Bolívia com o time entrando de mãos dadas pela primeira vez. Decisão contra o Uruguai com risco real de eliminação em pleno, capricho do destino, Maracanã. Com direito a Careca cortado e um tal de Romário (aquele que tinha se rebelado contra o Parreira por ter cruzado o oceano pra ficar na reserva contra a Alemanha em Porto Alegre) trazido de volta do exílio da seleção pra ter a atuação mais perfeita que eu tinha visto até então depois de prometer a semana inteira que poria o Brasil na Copa. Tenho a fita do jogo até hoje. Aquele cara genial, rebelde e estupidamente autoconfiante fascinou o moleque de 14 anos que só pensava em Copa. Que tipo de jogador garante pra 150 milhões de pessoas que trará um titulo mundial depois de 24 anos, mesmo sabendo que o elenco é mediano, desacreditado e envelhecido? Só podia ser um tipo de messias. Romário turbinou minha obsessão e a partir de maio eu simplesmente não assistia aula no colégio. Assim como o Charlie Brown, eu só escutava o professor murmurar enquanto devorava todas as revistas da Copa, devidamente escondidas embaixo da mesa. Finalmente 17 de junho chegou e aquela Bolívia de La Paz e Recife deu trabalho pra toda poderosa campeã do mundo, que se salvou com um gol de Klisman em Chicago. Movido a Romário, o Brasil estreou com tranquilidade, marcou cedo num lance que o goleiro russo deve tentar entender até hoje e neutralizou de vez a tensão da estreia com um Raí que já não era mais aquele. Se a Alemanha sofria e o Brasil vencia com tranquilidade poderia haver uma chama de esperança. Chama que se reforçou naquele 3x0 contra o então respeitado time de Camarões cujo primeiro tempo eu não consegui ver porque o carro quebrou no meio da estrada indo pro Guarujá. Quando celular não estava disseminado ainda e isso acontecei, só restava esperar por uma alma caridosa que parasse e nos socorresse. Chama que quase se apagou diante do balde de água fria do terceiro jogo. Partida sonolenta, estádio estranho, golaço de Kennet Andersson e empate em gol de bico do messias. Eu colava recortes de jornal e revista com fotos do Romário em meu banheiro. Próximo de uma foto do Baixinho tinha uma matéria sobre o jogo com uma expressão que me marcou: “retrato fiel e bisonho da partida”. Um time bisonho poderia ser campeão? Vieram as oitavas e não levamos muito a sério o fato da partida ser contra os anfitrioes e no feriado da independência dos caras. Isso até Leonardo encarnar Edmundo e desferir aquela cotovelada em Tab Ramos. O jogo se complicou e virou um trabalho para Romário, que encaixou um passe perfeito pra Bebeto acertar a garrafinha de água de Meola e sair dizendo que amava o Baixinho para os tais 150 milhões verem e ouvirem. Quartas de final contra a Holanda. Minha mãe resolve fazer um maldito churrasco. Umas 30 pessoas. O curta metragem de Brasil x Argentina quatro anos antes passa na minha cabeça e subo escondido para ver o jogo em paz com o Magrão. Jogo bom, golaço do Baixinho, golaço do Bebeto. Apagão geral e os caras empatam, o time tomou 2 dos 3 gols que sofreu na Copa num intervalo de doze minutos. Ajoelhado no chão e com a respiração presa,vi o desvio de corpo genial do messias e o gol de Branco. Pra balancear o estresse nada como uma semifinal sonolenta com gol simbólico de cabeça de um cara de 1,68m contra os gigantes vikings. Chuva de papel picado protocolar na casa de um amigo da minha mãe. 24 anos depois e os mesmos caras na final. É difícil explicar a sensação. Não sou uma pessoa de fé mas rezava muito. Não tinha medo dos italianos mas não sabia se o time seria o bisonho, o sonolento ou aquele contra a Holanda. Ajoelhado de novo na frente da mesma TV em que tinha visto Senna morrer ao vivo onze semanas antes, vi a disputa de pênaltis sozinho. O Magrão tinha voltado para São Paulo e minha mãe estava rezando na varanda. Luciano do Valle dizendo que Tostão era pé quente, pé quente, pé quente e Romário chorando que nem criança abraçado com a taça que ele prometera ganhar alguns meses antes. Não sei se foi a espera, a tensão, a obsessão ou o time bisonho. Mas aquela conquista teve um gosto de prazer misturado com dor. Mais alívio do que alegria. Mais redenção do que realização. Ser campeão do mundo era tudo que eu queria mas deveria ser mais prazeroso do que aquilo.

sexta-feira, julho 02, 2010

Dr. Jeckyll e Mr. Hyde 

O jogo era difícil antes de começar, ficou surpreendentemente fácil ao final do primeiro tempo e tornou-se impossível no segundo tempo, talvez por não termos sabido gerenciar a esperada pressão no início e, principalmente, pelo inimaginável descontrole que se seguiu ao primeiro gol laranja.

O Brasil entrou bem postado, compacto, criativo e não é exagero dizer que poderia ter marcado três vezes e liquidado a fatura. No segundo tempo demonstrou um destempero emocional inaceitável para uma equipe tão experiente (arrisco que nem três titulares chagarão a 2014), materializado na tragédia anunciada do bipolar Felipe Melo. Justiça seja feita, pode-se dizer que Felipe Melo foi o único jogador presente nos quatro lances capitais da partida, mas não que tenha decidido o jogo. No máximo, sepultou a recuperação. O Brasil já tinha voltado atordoado para o segundo tempo e o lance do primeiro gol holandês foi uma infelicidade de Julio César. Jogos parelhos são decididos nos detalhes.

Se contra o Chile a vitória foi construída nos pontos fortes da era Dunga, hoje a derrota veio justamente na bola aérea (terceira eliminação seguida do Brasil em lances de bola parada) e em falha do melhor goleiro do mundo. O time entrou em pane, o contra-ataque não encaixou e sequer conseguimos chegar na base do abafa. A Holanda mostrou-se equilibrada, não se abalou com o mau primeiro tempo e tampouco recuou excessivamente após virar o placar. Poderia, inclusive, ter saído com uma vitória mais elástica, em lances no final do jogo que mais pareciam casados x solteiros em churrasco.

Sempre acreditei que atravessávamos uma entressafra onde os poucos medalhões tinham problema de postura (Ronaldinho e Adriano) e os jovens talentos não foram testados a tempo. Dentro deste cenário, o Brasil montou uma seleção competitiva e comprometida, que está hoje entre as quatro melhores do mundo, mesmo que o chaveamento da Copa não permita que isso ocorra na prática.

Avaliando os jogadores, a defesa dispensa comentários (Lúcio e Juan falharam quando todo o time já tinha entrado em parafuso), Michel Bastos não reviveu Zé Carlos-98 e os volantes fizeram até mais do que deles se esperava. Elano e Dani Alves são opostos no que diz respeito a render mais pelo time ou pela seleção, a contusão do ex-santista foi uma perda significativa. Ninguém questiona o talento de Dani Alves, mas definitivamente seu estilo não é compatível com o esquema de Dunga. Prende excessivamente a bola e abusa do individualismo, matando assim a saída rápida e a troca de passes em velocidade.

Kaká é um caso à parte. Seu mundial não foi um fiasco, mas eu esperava que crescesse dentro da competição a ponto de ser decisivo, o que não ocorreu. Seu quadro clínico definirá se estará presente em 2014. Robinho tem lampejos geniais, mas não é um fora de série. O erro de muitos é esperar dele um novo Garrincha. Luis Fabiano, por fim, é um jogador esforçado e decisivo, mas é duro substituir Careca, Romário e Ronaldo, mestres do fundamento que diferencia o Brasil dos demais.

Dunga teve méritos em recuperar o espírito competitivo e a dignidade, além de montar um esquema letal que explorava a potencialidade de seus parcos talentos. Seus deméritos são a baixíssima inteligência emocional (que certamente contagia a equipe, pilhada em campo), a ausência de alternativas táticas, o imediatismo e algumas falhas na convocação, principalmente para o meio de campo. Ao seguir à risca o princípio da gratidão (vide Júlio Batista), montou um grupo que não lhe oferecia opções de qualidade quando precisava alterar a situação do jogo. Em tempo, acho uma perda de tempo discutir se a concentração deve ser oba-oba ou clausura, não acho que isso em si defina o resultado. Não defendo que Dunga deva permanecer, mas também não acho que tenha feito um papelão como fizemos em 66, 90 e, em menor escala, em 2006.

Em retrospectiva, o Brasil foi levemente melhor que 2006 (com um elenco muito pior), em especial na postura diante da derrota. Não senti hoje a vergonha de 1º de julho de 2006. Também discordo de quem vê neste time o estilo de 94. Basta ver os gols do Brasil para constatar que apresentamos um futebol melhor do que nos Estados Unidos.

Olhando pra frente, temos uma janela de renovação, pois o que fizemos de 2006 para cá foi substituir jogadores com problema de comportamento por outros mais esforçados e unidos, mas este time é até mais velho que o de quatro anos atrás. São poucas as opções para substituir Dunga, não acho que devamos inovar no banco e em campo ao mesmo tempo e desta forma Felipão me parece ser a melhor alternativa, resta saber se o gaúcho está disposto. Historicamente as seleções são compostas por jogadores que se surgiram entre quatro e oito anos antes da copa, basta ver que agora tivemos em campo a geração que emergiu em 2002. Dito isso, chegou a hora de Thiago Silva, Ramires, Ganso, Neymar, Philippe Coutinho, Pato e companhia. Não temos eliminatórias, já somos favoritos e ninguém quer reviver o Maracanazo.

segunda-feira, junho 28, 2010

Não pedala, Robinho 

Hoje vimos um Brasil diferente. Forçado pelas contusões ou não, Dunga colocou em campo um time mais leve, dinâmico e que desde os cinco minutos de jogo mostrou um repertório de jogadas muito mais variado do que vinha fazendo: tabelas, chutes de fora da área, coesão, evolução em velocidade. De negativo, apenas o bloqueio de Maicon executado por Bielsa, o que resultou num jogo mais afunilado, sem espaço para Kaká e Robinho e trazendo de novo a imagem de Lúcio armando o jogo, o que é um péssimo sintoma de um time encaixotado. Daniel Alves passou a errar passes e o jogo deu pinta que seria mais complicado.

Foi então que a primeira marca registrada do time de Dunga apareceu. Bola aérea, Juan e rede. Eu adoro o delay da TV digital quando o gol é brasileiro, quebra a ansiedade. Falando em marca registrada, o Chile mostrou a sua: toma o gol, se atira pro ataque sem recursos e cede o contra-ataque. Bola roubada, esticada pro Robinho, o Galvão grita “pedala, Robinho” e eu respondo “não escuta ele, não pedala, Robinho”. Ele me escuta, joga objetivamente, Kaká dá uma assistência genial e Luis Fabiano faz o que sabe como poucos (reparem como ele não perde gols). Fim de jogo.

No segundo tempo tivemos a pá de cal em arrancada de Ramires, o queniano. Robinho fez o gol, mas dos três talentos foi o de pior atuação. Jogo em banho maria, nos permitindo poupar os talentos e observar a maturidade do time brasileiro que, se não é brilhante, é extremamente sólido, equilibrado, mentalmente forte e competitivo. Difícil de ser batido.

Em termos individuais, Maicon foi neutralizado pelo plano de Bielsa, a zaga foi segura como sempre, Michel não comprometeu, Gilberto Silva segue firme, Daniel Alves errou muitos passes, alternando bons e maus momentos, Ramires foi o elemento surpresa e Kaká mostrou evolução satisfatória. Pode fazer mais. Quanto ao Chile, é duro quando o craque está no banco.

Não devemos temer a Holanda. O estilo de jogo é compatível com o nosso, entendo que temos leve vantagem, é de se esperar um jogo aberto naquele que será o primeiro teste para separar os homens dos meninos. Do outro lado da chave, o “fator Messi” definirá o vencedor e um dos finalistas da Copa. De qualquer modo, a taça já estará em melhores mãos do que quatro anos atrás.

Não pedala, Robinho 

Hoje vimos um Brasil diferente. Forçado pelas contusões ou não, Dunga colocou em campo um time mais leve, dinâmico e que desde os cinco minutos de jogo mostrou um repertório de jogadas muito mais variado do que vinha fazendo: tabelas, chutes de fora da área, coesão, evolução em velocidade. De negativo, apenas o bloqueio de Maicon executado por Bielsa, o que resultou num jogo mais afunilado, sem espaço para Kaká e Robinho e trazendo de novo a imagem de Lúcio armando o jogo, o que é um péssimo sintoma de um time encaixotado. Daniel Alves passou a errar passes e o jogo deu pinta que seria mais complicado.

Foi então que a primeira marca registrada do time de Dunga apareceu. Bola aérea, Juan e rede. Eu adoro o delay da TV digital quando o gol é brasileiro, quebra a ansiedade. Falando em marca registrada, o Chile mostrou a sua: toma o gol, se atira pro ataque sem recursos e cede o contra-ataque. Bola roubada, esticada pro Robinho, o Galvão grita “pedala, Robinho” e eu respondo “não escuta ele, não pedala, Robinho”. Ele me escuta, joga objetivamente, Kaká dá uma assistência genial e Luis Fabiano faz o que sabe como poucos (reparem como ele não perde gols). Fim de jogo.

No segundo tempo tivemos a pá de cal em arrancada de Ramires, o queniano. Robinho fez o gol, mas dos três talentos foi o de pior atuação. Jogo em banho maria, nos permitindo poupar os talentos e observar a maturidade do time brasileiro que, se não é brilhante, é extremamente sólido, equilibrado, mentalmente forte e competitivo. Difícil de ser batido.

Em termos individuais, Maicon foi neutralizado pelo plano de Bielsa, a zaga foi segura como sempre, Michel não comprometeu, Gilberto Silva segue firme, Daniel Alves errou muitos passes, alternando bons e maus momentos, Ramires foi o elemento surpresa e Kaká mostrou evolução satisfatória. Pode fazer mais. Quanto ao Chile, é duro quando o craque está no banco.

Não devemos temer a Holanda. O estilo de jogo é compatível com o nosso, entendo que temos leve vantagem, é de se esperar um jogo aberto naquele que será o primeiro teste para separar os homens dos meninos. Do outro lado da chave, o “fator Messi” definirá o vencedor e um dos finalistas da Copa. De qualquer modo, a taça já estará em melhores mãos do que quatro anos atrás.

domingo, maio 30, 2010

Relembre o jogador - Zé Carlos 

Dunga foi generoso em sua convocação. Generoso com os cronistas de Trivela que escrevem para a seção “Relembre o jogador”. Afinal, não é difícil visualizar nestas páginas, dentro de alguns anos, um Relembre Michel Bastos, Relembre Felipe Melo, Relembre Josué ou Relebre Grafite. Bela safra pro “Relembre” esta de 2010, obrigado, professor.

Zagallo também fez sua parte e em 98 convocou Zé Carlos para a reserva de Cafu. “Ah, mas o Cafu tem quatro pulmões e leva poucos cartões, o reserva dele nunca jogaria de qualquer maneira”, pode pensar o leitor mais desavisado. Zé Carlos não só jogou, como o fez na semifinal da Copa diante da Holanda de Seedorf, Davids, Bergkamp e Kluivert. Atuação pra Galvão “Haja Coração” Bueno nenhum botar defeito.

José Carlos de Almeida é paulista de Presidente Bernardes e nasceu em 14 de novembro de 1968. Iniciou a carreira no São José-SP aos 21 anos. Do interior emigrou para a capital, onde defendeu o Nacional por duas temporadas. Na sequência, iniciou uma trajetória cigana, passando por São Caetano, Portuguesa, União São João, Juventude e Matonense, nunca ficando mais de um ano em cada equipe.

1997 foi um divisor de águas na carreira do atleta. Zé Carlos teve participação decisiva na campanha que resultou na promoção da Matonense da série B para a primeira divisão paulista. Atraiu a atenção do São Paulo e realmente não tinha ideia do que o aguardava. A bola de prata da revista Placar no mesmo ano era só o começo.

Comandado por Nelsinho Batista e ao lado de Raí(na final), França e Denílson, fez um excelente campeonato paulista em 98, conquistando o título e dando a impressão que poderia resolver a carência na reserva da lateral direita da seleção de Zagallo.

Mantendo a sina de Forest Gump, Zé Carlos estva no lugar certo na hora certa. Flávio Conceição, nome certo pro torneio, contundiu-se e o lateral tricolor foi convocado pro mundial sem ter atuado um minuto sequer pela seleção brasileira. Na época a convocação foi elogiada por parte da imprensa em virtude da versatilidade apresentada pelo jogador. De quebra levou a camisa 13, número predileto do velho lobo.

Zé Carlos fez as malas e embarcou para a França para juntar-se a Rivaldo, Roberto Carlos, Ronaldo e Bebeto. Boa praça, destacou-se nos treinamentos...como excepcional imitador de animais. Suas especialidades eram o papagaio e o galo. Nas horas vagas jogou futebol na semifinal da Copa, dia 7 de julho em Marselha contra a Holanda que havia eliminado a Argentina dias antes. Para quem morava e trabalhava em Matão um ano antes, a realidade tinha mudado bastante.

A atuação de Zé Carlos foi sofrível, assim como a de todo o sistema defensivo brasileiro. Envolvido pela movimentação constante de Zenden e Bergkamp, o lateral saiu atordoado de campo. Humilde, o jogador reconheceu que não foi bem, comemorou a classificação e lamentou o título perdido na final contra os donos da casa. A propósito, Zé Carlos era vizinho de quarto de Ronaldo na concentração e foi um dos primeiros a socorrer o atacante no lendário episódio da convulsão.

Terminada a copa, o lateral encerrou sua breve passagem pela seleção (2 jogos) e voltou ao São Paulo, onde permaneceu por mais uma temporada. No ano seguinte passou a vestir a camisa do Grêmio, que trocou pela da Ponte Preta, seguindo pro Joinvile até encerrar a carreira no Noroeste-SP em 2005.

Após pendurar as chuteiras, Zé Carlos voltou a Presidente Bernardes para ajudar na revelação de novos talentos. Atualmente mora em Osasco e trabalha num projeto social.

Os fãs de Trivela na Argentina deveriam guardar este texto. Vocês podem precisar dentro de alguns anos. Afinal, Diego Maradona convocou para a Copa Ariel Garcé, lateral de 30 anos do Colón, após uma exibição de gala num amistoso contra o Haiti. Se o raio cair duas vezes no mesmo continente, caberá a Garcé marcar Fernando Torres numa eventual semifinal, coincidentemente, no dia 7 de julho.

Zé Carlos


Data de Nascimento: 14/11/1968

Local de Nascimento: Presidente Bernardes-SP<>
Clubes que defendeu:

1990-1990: São José-SP

1991-1992: Nacional-SP

1993-1993: São Caetano-SP

1994-1994: Portuguesa-SP

1995-1995: União São João-SP

1996-1996: Juventude-RS

1997-1997: Matonense-SP

1997-1999: São Paulo

1999-1999:Grêmio

2000-2000: Ponte Preta-SP

2001-2001: Joinville-SC

2002-2002: Noroeste-SP

2002-2004: Joinville-SC

2005-2005: Noroeste-SP

Principais títulos:
- Campeão Paulista (1998)
- Campeão Gaúcho (1999)
- Campeão Catarinense (2001)

domingo, maio 23, 2010

O olheiro 

Craque desde o jardim da infância, Fábio era o orgulho do pai, que vivia cornetando no ouvido do vizinho palmeirense:”este moleque um dia vai brilhar no Timão”. Brilhar era de fato uma rotina na vida do menino. Craque da rua, melhor jogador do colégio, campeão interclubes, destaque em excursão fora do Brasil. Nada parecia intimidar o garoto que trazia confiança, força física e mental, habilidade e ambição na veia. Seu caminho já estava trilhado e a primeira peneira veio mais naturalmente que o primeiro fio de barba.

Quis o destino que o caminho de Fábio no vestibular da bola fosse mais tortuoso do que o esperado. Campo elameado, ligação direta defesa-ataque, e nada do habilidoso meia mostrar serviço. Tomou pau. Veio a segunda peneira e novamente o acaso lhe driblou, colocando um semi-Maradona para competir com ele pela mesma vaga.

Pensando em Cafu e suas dez tentativas, Fábio não esmoreceu. Perseverou e na terceira peneira veio a fatalidade: ligamento cruzado rompido. Duas cirurgias e dez meses de fisioterapia depois, o rapaz era apenas um mal acabado rabisco do craque que um dia fora. Pendurou as chuteiras que nunca calçou.

Ocorre que o rapaz estava tão obcecado com sua promissora carreira que ele simplesmente não tinha um plano B. Tinha deixado o colégio na 6ª séria e nem cogitava voltar a estudar, nao tinha a menor aptidão para qualquer outra atividade e, de quebra, tinha uma relação mal resolvida com o futebol que já beirava a fixação. Depois de muito pensar, decidiu ser olheiro e viajar pelo Brasil afora.

Arruinando talentos. Isso mesmo. Fábio passou a farejar talentos para literalmente perseguí-los e, por meio de conchavo, suborno, politicagem, sabotagem, difamação e outros expedientes da mesma nobreza, garantir que nenhum menino de talento fosse aprovado nas peneiras em que ele participava. Seus relatórios mais pareciam sentenças do julgamento final: “mascarado”, “franguinho”, “sem inteligência emocional”, “fominha”, “bichado”, “laranja podre”, “sem futuro”, “enganação”. Sua caneta cuspia sangue.

Depois de um certo tempo na profissão, Fábio construiu uma rede de contatos que lhe permitiu cobrir o Brasil inteiro. Tão logo soubesse de um craque em potencial, se deslocava o mais rápido possível para participar da peneira e vetar o jovem talento. Com isso, ganhou reputação de exigente e passou a ser requisitado. Arrogante, gostava de se gabar e a ele era atribuída uma espécie de seleção fúnebre: já havia vetado um “quase-Zico”, um “quase-Rivaldo”, um “quase Kaká”, entre outros quases. Comenta-se no Pará que sua vítima mais recente colocava o Paulo Henrique Ganso no bolso.

E foi justamente quando estava no Pará que ele recebeu uma ligação de um de seus inumeros auxiliares: “Fábio, corre pra cá. Apareceu um moleque na várzea aqui em São Paulo que você não pode perder. O moleque é fera e a peneira é no sábado de manhã”.

Sedento por mais uma sentença de morte, Fábio chegou em São Paulo às pressas, nem passou em casa e foi direto pro campinho de várzea. Confiando em seu auxiliar, manipulou a situação de modo que a decisão de aprovar ou vetar os meninos naquela manhã fosse sua.

“É aquele ali”, apontou o auxiliar. “Dizem que perto dele o Djalminha seria um cabeça de bagre”. Fábio fixou o olhar no jovem camisa 10 e naquele instante alienou-se de tudo ao seu redor. Em transe, ignorou os auxiliares e os demais jogadores e fitou incansavelmente aquele meia esquerda: que classe, que visão, que personalidade, que capacidade de decisão. Estava diante do maior jogador que já vira em 25 anos como olheiro.

Terminada a partida, Fábio estava visivelmente perturbado. “Está aqui a ficha dele, acaba com ele”, lhe disse o responsável pela peneira. “Preciso de cinco minutos”, respondeu Fábio. Consternado, dirigiu-se ao vestiário, ligou o chuveiro e enfiou a cabeça embaixo da água gelada. Naqueles longos três minutos, sua vida toda lhe passou pela cabeça: os primeiros chutes, os títulos, o pai sacaneando o vizinho, as peneiras malditas, a cirurgia, a vida de olheiro, o casamento, os dois filhos, o falecimento do pai.

Voltou ao campo compenetrado, pediu a ficha e, convicto, vetou o meia esquerda: “firulento e muito fraco fisicamente. Não tem potencial”.

Ao deixar o campo, encontrou a mulher e os dois filhos no estacionamento. Eufórico e ainda vestindo a dez, Leozinho se virou ao pai e disse:

- “Você viu o jogo, pai? Todo mundo disse que eu arrebentei, acho que consegui uma vaga aqui no Corinthians, vou ser profissional”.
- “Vamos ver, Leozinho. Vamos ver”.

domingo, abril 18, 2010

Relembre o jogador - Dadá Maravilha 

No dia 13 de abril Dario José dos Santos caminhava pelo estádio do Maracanã quando parou para abraçar uma estátua. Queria “reatar relações” com João Saldanha, seu suposto desafeto desde as eliminatórias para a Copa de 70. É por estas e outras que Dadá Maravilha entrou para o folclore do futebol brasileiro. A ponto de fazer com que muitos se esqueçam que por trás do folclore está o terceiro maior goleador do futebol brasileiro.

Dario é carioca e nasceu em 4 de março de 1946. Sua infância e juventude foram traumáticas. Aos 5 anos assistiu ao suicídio da mãe e foi internado pelo pai no Serviço de Assistência aos Menores (SAM), onde ficaria pelos próximos 14 anos. Ainda adolescente, tentou se matar.

Antes de se tornar goleador, foi detido por furto aos 19 anos. O que poderia ter significado a ruína foi na verdade sua salvação. Foi na Febem que Dario iniciou-se no futebol. No mesmo ano ele passou a integrar os juniores do Campo Grande, profissionalizando-se (tardiamente, para os padroes atuais), dois anos depois.

Os gols chamaram a atenção e em 68 Dadá desembarcava em Belo Horizonte para defender o Galo. No ano seguinte viria a polêmica: o presidente Medici, atleticano fervoroso, estaria pressionando o técnico João Saldanha a convocar e escalar Dadá Maravilha na seleção brasileira. Comenta-se que o treinador até apreciava o futebol decisivo do centroavante desengonçado, mas diante da pressão presidencial saiu-se com algo do gênero “eu não me meto na escalação do ministério, ele que não se meta na escalação da seleção”.

Não por causa do incidente, Saldanha caiu e Zagalo assumiu, convocando Dadá, artilheiro do campeonato mineiro, para o mundial. Mais uma confirmação da estrela do jogador, que no ano seguinte igualaria-se ao helicóptero e ao beija-flor, parando no ar para fulminar o Botafogo no Maracanã e levar o título do primeiro campeonato brasileiro para as Alterosas.

Dadá completou sua quinta temporada pelo Galo em 72 e decidiu cair na estrada. Nos 14 anos seguintes, defenderia 14 equipes diferentes. Fora de Minas, brilhou com a camisa do Colorado ao fazer o gol do bicampeonato brasileiro sobre o Corinthians, justificando sua contratação a peso de ouro para os valores da época.
Nas horas vagas, Dadá era frasista inveterado, sendo atribuídas a ele perólas como: "Não existe gol feio. Feio é não fazer gol.";"Nunca aprendi a jogar futebol pois perdi muito tempo fazendo gols"; "Num time de futebol existem nove posições e duas profissões: o goleiro e o centroavante"; "Quando eu saltava o zagueiro conseguia ver o número da minha chuteira";” Dentro da área não houve, não há e não haverá igual Dadá: ele tem o olhar balístico da águia, a velocidade do Falcão e a impiedade do abutre”.
Filosofia à parte, Dario deixou seu nome marcado na história do futebol brasileiro. Na carreira longeva foram quatro artilharias do campeonato minineiro, três do Brasileiro, 10 gols numa única partida e a bagatela de 926 na carreira, sendo 499 de cabeça.
Dadá pendurou as chuteiras aos 40 anos e arriscou-se brevemente como técnico, treinando a Ponte Preta e o Brasília, além do título Amapaense pelo Ypiranga. Abandonada a prancheta, e como era de se imaginar, tem sido muito disputado como comentarista esportivo na tv mineira.
Dadá Maravilha


Data de Nascimento: 04/03/1946

Local de Nascimento: Rio de Janeiro<>
Clubes que defendeu:

1967-1968: Campo Grande-RJ

1968-1972: Atlético-MG

1973-1974: Flamengo

1974-1974: Atlético-MG

1974-1975: Sport Recife

1976-1978: Internacional-RS

1978-1979: Ponte Preta-SP

1979-1979: Paysandu

1980-1980: Náutico

1981-1981: Santa Cruz

1981-1982: Bahia

1982-1983: Goiás

1983-1984: Coritiba

1984-1984: Bahia

1984-1985: Atlético-MG

1985-1985: Nacional-AM

1985-1986: XV Piracicaba-SP

1986-1986: Douradense-MS

1986-1986: Comercial de Registro-SP

Principais títulos:
- Campeão Mundial (1970)
- Campeão Mineiro (1970)
- Campeão Brasileiro (1971)
- Campeão Pernambucano (1975)
- Campeão Gaúcho (1976)
- Campeão Brasileiro (1976)
- Campeão Mineiro (1978)
- Campeão Baiano (1981)
- Campeão Goiano (1983)
- Campeão Amapaense (Como Técnico-1994)

segunda-feira, março 08, 2010

Voo de galinha - Totó Schillaci 

Muito se falou sobre a questionável e provável ausência de Ronaldinho Gaúcho no mundial da África do Sul. A favor da exclusão do (ex?)craque milanista, pesa o argumento da coerência de Dunga. Afinal, o grupo já estaria fechado, suspeita reforçada pelas declarações do treinador após o amistoso contra a Irlanda, último antes da convocação final. Ao que tudo indica, porta está fechada.

Esperança, Ronaldinho, pode haver luz no fim do túnel. 20 anos atrás um homem chamado Salvatore Schillaci fez sua primeira partida pela seleção italiana em 31 de março. Ou seja, 69 dias antes da abertura da Copa da Itália. Não satisfeito com a convocação meteórica, “Totó” gravou seu nome na história dos mundiais ao sagrar-se artilheiro do torneio. Podia até não ser o homem certo, mas estava no lugar certo, na hora certa.

Nascido e criado no bairro pobre de San Giovanni Apostolo, em Palermo, Schillaci iniciou sua empreitada futebolística no amador Amat. Em 82, então com 17 anos, assinou seu primeiro contrato profissional com o Messina. E lá permaneceu, acreditem ou não, pelas 7 temporadas seguintes, aventurando-se pelas séries B e C da bota. Com isso tornou-se o jogador com maior número de partidas na história do clube. Nada muito notório.

Caminhava fortemente para o anonimato, quando transferiu-se em 89 para a Juve. Estreou na série A pouco mais de 9 meses antes da Copa. Clube novo, vida nova. Pela Juve, Shillaci desandou a fazer gols (15) e ganhou a Copa da Itália e a Copa da UEFA, convencendo Azeglio Vicini a convocá-lo para o mundial. Era a chance de sua vida.

E Totó agarrou-a como poucos. Aproveitando-se do mau momento de Viali e da infertilidade do ataque italiano, ele substituiu Carnevale aos 36 do segundo tempo da estreia contra a Austria e precisou de apenas dois minutos para marcar o gol da vitória. Atuando como titular, marcou contra a Tchecoslovaquia na terceira rodada e contra o Uruguai nas oitavas, este o mais belo dos gols que fez na Copa.

Nas quartas, novo gol contra a Irlanda. Graças a isso, anos depois Totó atuaria em uma propoaganda para uma famosa cerveja irlandesa.O comercial remetia ao gol de Totó e à vitória irlandesa contra a Itália na Copa seguinte.

Com gols decisivos contra Argentina (semifinal) e Inglaterra (disputa de 3º lugar), Schillaci levou pra casa a chuteira de ouro da FIFA e encerrou o mês mais sensacional de sua vida (muitos italianos se referem à Copa de 90 como “as noites mágicas de Totó Schillaci”). Seu sucesso foi tão efêmero que o jogador carrega a inusitada marca de sete gols pela seleção nacional, seis deles durante uma Copa do Mundo. Por pouco não se tornou o heroi de um titulo italiano em casa.

Após seus 30 dias de Cinderela, atuou por mais uma temporada pela Juve antes de se transferir para a Inter, onde jogou por dois anos, sem brilho. Decidiu então cruzar o mundo e transformou-se em “Toto-San”, o primeiro italiano a disputar a J-League. Foi ídolo do Júbilo Iwata durante quatro temporadas. Dono de uma estrela rara, encerrou sua carreira (que pela fugacidade lembra um voo de galinha) em 1999.

Hoje Totó é dono de uma escolinha de futebol em Palermo e apresenta um programa esportivo na RAI. Em 2004 voltou aos holofotes ao participar do reality show L'isola dei famosi.

Salvatore Schillaci


Data de Nascimento: 01/12/1964

Local de Nascimento: Palermo, Itália<>
Clubes que defendeu:

1982-1989: Messina-ITA

1989-1992: Juventus-ITA

1992-1994: Inter de Milão-ITA

1994-1998: Jubilo Iwata-JAP
Principais títulos:
- Copa UEFA (1990)
- Copa da Itália (1990)
- 3o lugar na Copa do Mundo (1990)

domingo, janeiro 24, 2010

Relembre o jogador - Mauro Silva 

Com o futebol dominado pelos empresários e craques “in vitro” sendo exportados aos 16 anos, além do advento dos pontos corridos, fica cada vez mais improvável um time pequeno ser campeão de alguma coisa digna de nota. Nem sempre foi assim. Não foi assim no Paulistão disputado 20 anos atrás e que viu o Bragantino erguer o caneco.

Aquela decisão projetou nomes como Vanderlei Luxemburgo, Luis Carlos Prima, Nelsinho Batista, Luis Carlos Goiano, Gil Baiano, Robert, Sílvio e os futuros campeões do mundo em 94 Paulo Sérgio, Márcio Santos e Mauro Silva. Com diferente intensidade, frequência e duração, todos brilharam, mas nosso destaque hoje vai para o volante cuja história está intimamente entrelaçada à do Deportivo La Coruña. A incrível história de um jogador que só atuou em times pequenos, que marcou um gol em 430 partidas disputadas e que mesmo assim exibe um currículo pra lá de vitorioso.

Mauro é natural de São Bernardo, filho de um eletricista e caçula de 3 irmãos, e completou 42 anos no último dia 12. Iniciou a carreira profissional no Guarani em 1988, quando foi vice-campeão paulista ante o Corinthians de Viola. Espécie em extinção, defenderia apenas mais dois clubes ao longo de 17 anos de carreira: Bragantino (90-92) e La Coruña (92-2005).

Hoje é fácil dizer, mas na época a troca de Campinas por Bragança Paulista não parecia assim tão promissora. Afinal, Mauro vinha de uma série de contusões gravíssimas no joelho esquerdo e púbis, ambas resultando em cirurgia. Com a pecha de bichado, foi trocado com o Bragantino, junto com mais seis jogadores, pelo anônimo Vitor Hugo. Como azar pouco é bobagem, estorou o outro joelho na quarta partida pela nova equipe.

A despeito de tudo isso, Mauro Silva revelou-se o jogador certo na hora certa no lugar certo. No cenário local, Luxemburgo tinha(tem?) uma grande visão do futebol e montava uma equipe competitiva. Em âmbito internacional, a seleção brasileira amargava uma fila de mais de 20 anos e digeria o fracasso retumbante da Copa na Itália. Falcão tinha sido chamado para renovar radicalmente o grupo e foi então que a janela de oportunidade se abriu diante de Mauro Silva. A primeira convocação veio em ainda 90.

Campeão Paulista, Mauro seguiu no Bragantino e foi vice-campeão brasileiro no ano seguinte sob o comando de Carlos Alberto Parreira, justamente seu técnico na copa de 94. Novamente, a sorte ajudando a competência. De quebra, faturou a bola de ouro da Placar no mesmo ano.

No final de 92, após levar a bola de prata, pintou o convite para atuar no desconhecido La Coruña. Qualquer hesitação foi superada pela ida de Bebeto no mesmo ano. O pequeno time espanhol devia mesmo estar aspirarando uma mudança de patamar.

Na Espanha a adaptação foi fácil e Mauro manteve a cadeira cativa na seleção brasileira. Enquanto o La Coruña fazia sua escalada na Espanha, Mauro sofria com a dramática classificação para a copa de 94, obtida no último jogo, contra o Uruguai no Maracanã.
Veio o mundial dos EUA, mais uma vez os ventos sopraram a seu favor, e Mauro Silva sagrou-se campeão após sete partidas e 616 minutos. Muitos atribuem a ele a solidez que permitiu ao time de Parreira viver dos lampejos geniais de Romário. Mas, capricho do destino, na final contra a Itália não foi o Baixinho quem mais se aproximou do gol. Afinal, quem não se lembra do chute de Mauro Silva, 0 gols pela seleção, que beijou a trave de Pagliuca?

Mesmo após a campanha vitoriosa, o volante preferiu permanecer no La Coruña(teve proposta do Real Madrid), onde em 13 anos conquistou seis troféus (destaque para o campeonato espanhol de 2000) e, mais do que isso, prestígio e respeito difíceis de mensurar.

Em paralelo, seguiu defendendo a seleção, conquistando a Copa América de 97 como homem de confiança de Zagalo. Por pouco não disputou sua segunda copa do mundo em 98(machucou-se na Copa Ouro e perdeu o lugar no time), e vestiu esporadicamente a camisa amarela até 2001, quando disputou as eliminatórias com Felipão e novamente vislumbrou a possibilidade de jogar um novo mundial. Segundo ele, enterrou suas chances ao pedir dispensa da Copa América de 2001.

Fora da seleção depois de 11 anos, Mauro dedicou-se integralmente ao La Coruña por mais quatro anos, deixando a equipe como segundo jogador com mais atuações pelo clube na história. Pendurou as chuteiras no dia 22/5/2005, após um jogo contra o Mallorca no Riazor, e ganhou nada menos que uma rua na cidade com seu nome. Singela homenagem.

Hoje Mauro vive em São Paulo, prestando assessoria a empresas espanholas que atuam no mercado financeiro e imobiliário. Olhando em retrospectiva uma carreira gloriosa, só se arrepende de não ter defendido o tricolor paulista, seu time de coração. Inclusive, conforme revelou à revista Trivela (número 42), seu nome é uma homenagem ao ponta tricolor Maurinho.

Ficha
Mauro da Silva Gomes


Data de Nascimento: 12/01/1968

Local de Nascimento: São Bernardo do Campo, São Paulo<>
Clubes que defendeu:

1988-1989: Guarani-SP

1990-1992: Bragantino-SP

1992-2005: Deportivo La Coruña-ESP

Principais títulos:
- Campeonato Paulista (1990)
- Copa do Mundo (1994)
- Copa do Rei (1995, 2002)
- Supercopa da Espanha (1995, 2000, 2002)
- Copa América (1997)
- Campeonato Espanhol (2000)

segunda-feira, novembro 30, 2009

Relembre o jogador - Alemão 

Muito tem se falado da queda do muro de Berlim. Mas, se você for a Napoles e perguntar a um transeunte qual o evento histórico mais marcante de 1989, não se surpreenda ao ouvir que foi a copa da UEFA de 1989. O único título internacional expressivo celebrado pela quarta maior torcida da bota veio pelos pés de Diego Armando Maradona, Careca e, por que não, Ricardo Rogério de Brito, também conhecido como Alemão.

Alemão é mineiro de Lavras, onde nasceu em 22 de novembro de 1961. Deu os primeiros passos na carreira defendendo o Fabril e aos vinte anos se juntou ao Botafogo, clube que defenderia por sete temporadas e pelo qual conquistou a convocaçao para a Copa do México. Até hoje o jogador demonstra carinho pela equipe que o projetou no futebol.

Com a exposição internacional veio a transferência para o Atlético de Madrid. Apenas 35 jogos depois o volante trocaria as touradas pela pizza para defender o ascendente Nápoli de Maradona. A escolha se mostrou acertada, pois a equipe era muito competitiva, acabara de conquistar o scudetto na temporada 86-87. Iniciava-se ali uma era de ouro para o clube e seus principais jogadores, que desafiaram os temíveis Inter, Milan e Juventus, apimentando a histórica rivalidade entre norte e sul da Itália.

Foram dois scudetti, uma Copa da Itália e uma Supercopa da Itália. Em 1989 a superioridade do Napoli foi sentida também fora da bota. A campanha foi irretocável, com direito a duelo dramático contra a Juve nas quartas (0x2 em Turim e 3x0 em Napoli, com gol no último minuto da prorrogação), parada indigesta ante o Bayern Munique nas semis e dois jogaços contra o Stuttgart de Klinsmann na final. 2x1 em Nápoles e 3x3 em Stuttgart, com direito a gol de Alemão. A fase era ótima e cerca de dois meses depois o jogador ganharia a Copa América pela Seleção Brasileira.

Veio a conturbada Copa de 90 e a eliminação ante a Argentina do colega Maradona. Na época chegou a circular o rumor estapafúrdio de que Alemão teria aliviado a marcação em Maradona, suspeita totalmente descartada pelo volante. Encerrava-se ali um ciclo de 40 jogos e seis gols pela seleção canarinho.

De qualquer modo, a eliminação da Itália pela Argentina de Maradona pode sim ter impactado a carreira de Alemão. Há quem diga que a queda da Azurra desencadeou as investigações e intrigas que expuseram o doping de Maradona, acentuando a crise do Napoli e pondo fim ao ciclo vitorioso da equipe.

Alemão resistiu até 92, quando se transferiu para o Atalanta. Mais duas temporadas no calcio e despedida da Europa: era hora de voltar ao Brasil para defender as cores do São Paulo. A entresafra na era pós-Telê Santana fez com que a passagem de Alemão pelo tricolor não fosse vitoriosa como a de outros veteranos como Falcão e Cerezo.

A carreira entrava em queda livre e a próxima parada foi o Volta Rendonda, última equipe defendida pelo volante. Ele passou a atuar como procurador de jogadores e, a partir de 2007, seguiu o tradicional caminho de treinador, dirigindo o Tuynambás de Juiz de Fora pela segunda divisão mineira.

Em 2008 Alemão treinou o América Mineiro no módulo II do campeonato regional, de onde saiu em setembro para fazer estágios de treinador no Napoli e Reggina. Quer agregar teoria à experiência que teve com nomes como Zico, Maradona, Careca, Romário, Parreira e Telê Santana.

Recentemente deu declarações demonstrando confiança no trabalho dos ex-colegas Dunga e Maradona à frente de suas seleções nacionais. A despeito da suada classificação dos hermanos, Alemão aponta a Argentina como uma das favoritas para vencer o mundial da África.

Ficha
Ricardo Rogério de Brito

Data de Nascimento: 22/11/1961
Local de Nascimento: Lavras, Minas Gerais<> Clubes que defendeu:
1980-1980: Fabril-MG

1981-1987: Botafogo-RJ

1988-1988: Atlético de Madrid-ESP

1988-1992: Nápoli-ITA

1992-1994: Atalanta-ITA

1994-1996: São Paulo-SP

1996-1996: Volta Redonda-RJ

Principais títulos:
- Copa UEFA (1989)
-Copa América (1989)
- Supercopa da Itália (1990)
-Campeonato Italiano (1990)
- Recopa Sul-Americana (1994)
-Copa Conmebol (1994)

domingo, outubro 25, 2009

Heleno e Kaká 

Lapa, Rio de Janeiro, 26 de julho de 1943. A festança seguia regada a lança-perfume e, como não podia deixar de ser, Heleno de Freitas liderava o bacanal. Antes de entrar no quarto acompanhado de duas mulatas estonteantes, um amigo o aborda e oferece um drink fumegante:

- Bem sei que tu não és de falhar na hora H, mas com este drink tua festa só acabará na 3ª-feira.

Sem pestanejar, o craque aceitou a sugestão. Dentro do quarto, a festa ia de vento em popa, quando Heleno sentiu uma tontura repentina. Com o teto insistindo em girar, deitou-se no sofá da suíte e começou a dizer coisas sem nexo. Aos poucos a voz da mulherada começou a soar distante.....distante.....distante........

- Opa, que lugar é este? Que calor dos infernos é este?
- Se já sabe, por que pergunta?
- Carnaval em julho? Que fantasia ridícula é essa, chifrudo? Qual é a do garfo?
- Heleno, pelo amor de Lúcifer, respeite o Satanás. Acalme-se e escute o que tenho a lhe dizer. É pelo bem do futebol.
- Hum....sujeitinho arrogante. Mas, se tem a ver com futebol, tenho interesse em ouvir.
- Rapaz, algo terrível acontecerá com a nossa paixão e só você pode nos salvar. Dentro de meio século os jogadores de futebol estarão radicalmente transformados.
- Em que sentido? Imagino que pra melhor, pra frente é que se anda.
- Para pior, muito pior. Haverá uma maldição batizada de “politicamente correta”, praga de uma era conhecida como profissionalismo, e figuras como você entrarão em extinção.
- Politicamente o quê?
- Silêncio. O profissionalismo irá pasteurizar o futebol. Esqueça as brigas, olvide os porres homéricos, imagine o fim das algazarras.
- Só de pensar me dá um calafrio.
- Eu sei. Tenho refletido muito a respeito e acho que podemos alterar o curso da história.
- Simpatia, com todo o respeito. No ritmo que eu ando, não agüento mais cinco anos. Que dizer cinqüenta...
- Quieto, petulante. Leia as instruções que eu preparei e entre naquele caldeirão sem me questionar. Já perdi muito tempo com você, estou com a agenda cheia hoje.


Madri, 24 de agosto de 2009. Kaká estaciona seu carro na Cidade Desportiva, quinze minutos adiantado para o treino do Real.
- Ei, bela máquina. No meu tempo o salário não dava nem pro pneu.
- Kaká encara o desconhecido e pergunta: desculpe, eu lhe conheço?
- Ainda não, mas estou aqui pra te salvar. Tá vendo a loira e a morena no carro ali? Vamos bater uma bola com elas?
- Agradeço a gentileza, amigo, mas a bola que eu vou bater é lá dentro, o professor Pellegrini já deve estar chegando. Ademais, eu sou um homem casado.
- Que papo é este de casado? Vai dizer que casou virgem também? Para com essa bobagem de treino e vamos armar uma com aquelas gostosas. É só dizer que passou mal depois, você tem reputação.
- Não, obrigado. Nunca perdi um treinamento e não será hoje. Com licença, estou quase atrasado.
- Huuuum, o mariquinha vai perder o treininho.

Frustrado, Heleno bufou, entrou no carro com as gatas e dirigiu até o primeiro motel que encontrou no caminho.

Quinze dias se passaram e Kaká compareceu a um evento de moda em Madri convidado por um patrocinador. No banheiro, foi abordado pelo funcionário que fornece papel higiênico e vende balas:

- Aceita lança-perfume?
- Você, de novo? Senhor, minha esposa está me aguardando na mesa, peço que não me incomode mais.
- Para de bobagem, até você chegar na mesa o barato já passou. Parece que nunca cheirou lança.
- Não quero soar deselegante, mas se você insistir de novo terei que acionar a segurança.
- Se chamar eu derrubo na porrada, rebateu Heleno, enquanto o craque merengue lhe deixava falando sozinho.

Nas semanas seguintes, Heleno de Freitas intensificou sua abordagem. Carnaval fora de época no Rio, rave com o Robinho em Manchester, cassino em Mônaco com o Jenson Button, despedida de solteiro com o Fenômeno, roda de samba com o Gaúcho. Nada surtia efeito com Kaká. O que ele falaria para o demônio quando voltasse fracassado e de mãos vazias? Foi então que pensou numa ultima tentativa.

Na semana seguinte o Real embarcaria para Marselha em rodada da fase de grupos da Champions. Kaká como sempre foi o primeiro a embarcar. Assim que entrou no avião do Real estranhou as saudações do piloto:

- Boa tarde, senhores passageiros. Informo que antecipamos a decolagem e que alteramos nosso destino para a Ilha de Ibiza. Apertem os cintos.
- Ei, mas só estou eu no avião, cadê o resto do time, perguntou Kaká.
- Não tem resto do time, respondeu de bate-e-pronto o comissário de bordo, a esta altura um velho conhecido do camisa oito merengue. Vodka ou gim?

A aeronave estava tripulada pelas mulheres mais lindas da Europa, que bajularam o craque brasileiro desde a decolagem até o pouso em Ibiza.

Na chegada, uma festa privada aguardava o brasileiro na mansão alugada por Heleno de Freitas. Cercado de beldades, com um banquete repleto de iguarias, bebidas a perder de vista e trilha sonora perfeita, Kaká não resistiu àquela infinidade de tentações e pecou. Pecou sem dó.
No dia seguinte, ele acordou despertado pela ressaca, etílica e moral. Correu pra internet e viu no site do Ás: “Kaká perde vôo e preocupa comissão do Real. Caroline desconhece seu paradeiro”.

Completamente desorientado, o craque refletiu por quinze minutos e decidiu ligar para seu mentor à procura de uma palavra de sabedoria.

- Leo, é o Kaká. Preciso da sua ajuda, toma um vôo pra cá assim que você puder.

Sem entender nada, Leonardo aterrissou em Ibiza e rumou pra tal mansão. Boquiaberto, ouviu a história de Kaká e prometeu tirá-lo dessa fria. Desenharam um plano, escolheram os jornalistas que procurariam e bolaram todas as justificativas. Neste meio tempo, o Ás já tinha trocado sua manchete: “Nem Robinho desapareceu por tanto tempo. Ainda bem que não compramos Kaká, afirma Sulaiman Al-Fahim”.

Leonardo e Kaká deixavam a casa quando Heleno voltou.

- Os senhores estão de partida? Já vão, tão cedo?
- Sim, o Kaká tem compromissos contratuais e é meu dever como mentor levá-lo de volta a Madri.
- Kaká, meu chapa, vou ser bem sincero contigo. Tu és jovem, rico, talentoso e famoso. Se não curtir a vida agora, não vai ser com sessenta anos que vai aproveitar.
- Kaká, não dê ouvidos a ele. É por causa desta mentalidade que nós brasileiros somos tão mal vistos na Europa. Mostre a eles que você é diferente.
- Diferente? Romário, Ronaldo e Ronaldinho sabiam conciliar os golaços no campo com os outros marcados fora dele. Por que você não conseguiria?
- Prazeres? Como você explicaria estes prazeres para a UNICEF e para as crianças da África que dependem de você? Pense nos contratos, nos patrocinadores. Pense na família.
- OK, já entendi a lavagem cerebral do nosso amiguinho do Milan. Pode levá-lo. A única coisa que me parte o coração é que vocês perderão o campeonato aqui em casa hoje à tarde, terei que escalar o motorista e o mordomo.

Neste momento chega uma van abarrotada de modelos, que entram em polvorosa quando vêem que Leonardo também está na casa. O tumulto toma conta do lugar, a festa começa e é difícil descrever o que ocorre nas vinte horas que se seguem.

No dia seguinte, finalmente Leonardo e Kaká embarcam no jatinho. Abraçado ao craque e ao técnico, Heleno ordena ao piloto:

- Escala rápida no Rio pra pegar o Adriano. O Berlusconi espera a gente hoje à noite na Sardenha e não podemos furar com o homem.

domingo, agosto 23, 2009

Relembre o jogador - Super Ézio 

Parafraseando o saudoso Januário de Oliveira, “ta lá um corpo estendido no chão”. No caso, o corpo do Fluminense, que ao alcançar a lanterna do campeonato brasileiro no dia 23 de agosto deixou claro que são seriíssimas suas intenções de disputar a segunda divisão em 2010.

E agora, quem poderá socorrer o tricolor? Uma alternativa seria recorrer a um super herói que passou pelas Laranjeiras entre 1991 e 1995 e atende pelo nome de Ézio Leal Moraes Filho.

Super Ézio é um capixaba de Ponte de Itabapoana e completou 43 anos no último dia 15 de maio. Iniciou a carreira como ponta esquerda no Bangu em 1986, fazendo dupla com o centroavante Fernando, que passaria por Inter e Flamengo. De Moça Bonita se transferiu para o Olaria três anos depois.

Após breve passagem pelo Olaria, atuou pelo Americano de Campos antes de defender as cores da Portuguesa de Desportos entre 1990 e 1991. Não agradou e foi devolvido ao Bangu, detentor de seu passe. Foi então que sua carreira mudou de patamar.

Em 91, Ézio chegou ao Fluminense acompanhado de Bobô, egresso de passagem mal sucedida pelo São Paulo. Estreou com dois gols diante do Palmeiras e caiu nas graças da torcida. Naquele ano venceria a Taça Guanabara, feito igualado em 93, e no ano seguinte seria artilheiro do estadual com 15 gols.
A carreira de Ézio esteve perto de decolar na Copa do Brasil de 92. O tricolor chegou à final contra o Inter, venceu nas Laranjeiras com gol dele, mas caiu no Beira Rio com pênalti polêmico assinalado por José Aparecido de Oliveira e convertido por Célio Silva. Naquele momento Super Ézio disse adeus à disputa da Libertadores.

A identificação com o tricolor era forte e Ézio revela ter assinado contratos em branco e prometido não deixar o clube antes de conquistar um título, tudo em nome da paixão pelo clube. Ironicamente, o título viria em 95 quando Ézio não passava por uma boa fase e estava afastado da equipe titular. Sob o comando de Joel Santana e com gol de barriga de Renato Gaúcho contra o Flamengo de Romário e Luxemburgo em pleno ano de centenário, o atacante conquistava o único título expressivo de sua carreira.

Terminava ali uma história de cinco temporadas, 236 jogos, 118 gols, 12 deles contra o Flamengo. Super Ézio é o 8º maior artilheiro da história do Fluminense, segundo com mais gols em Brasileiros pelo clube e, atrás apenas de Assis, maior carrasco tricolor do Flamengo.
Novamente a sorte flertou com Ézio, mas seu pão caiu com a manteiga pra baixo de novo. A despeito de uma oferta do Palmeiras Parmalat para substituir Evair, o atacante acabou se transferindo para o Galo para nunca mais repetir o futebol dos anos tricolores. Com problemas no joelho, Super Ézio foi para a Inter de Limeira e ainda passou pelo CFZ e pelo Rio Branco-ES antes de pendurar as chuteiras.
Casado com a ex-body boarder botafoguense Isabela Nogueira e pai de gêmeos, Super Ézio agora divide seu tempo entre o Rio e Espírito Santo e faz seus gols no ramo de construção civil e decoração, administrando uma empresa familiar. Aspira uma posição de olheiro no Tricolor, mas nada de concreto.

Nas horas vagas, faz dupla de futevôlei na praia do Recreio com outro super herói: Jairzinho, o Furacão da copa de 70.

Ficha
Ézio Leal Moraes Filho

Data de Nascimento: 15/05/1966
Local de Nascimento: Ponte de Itabapoana, Espírito Santo<> Clubes que defendeu:
1986-1989: Bangu-RJ

1989-1990: Olaria-RJ

1990-1990: Americano de Campos-RJ

1990-1991: Portuguesa-SP

1991-1995: Fluminense

1995-1996: Atlético-MG

1996-1997: CFZ-RJ

1997-1998: Inter de Limeira-SP

1998-1998: Rio Branco-ES


Principais títulos:
- Taça Guanabara (1991/1993)
- Campeonato Carioca (1995)

segunda-feira, julho 27, 2009

Relembre o jogador - Mark Fish 

Se hoje o maior destaque da seleção sul africana é o inglês(?) de Joel Santana, vale lembrar que nem sempre foi assim. Os Bafana Bafana já gozaram de muito prestígio e status de potência regional. Mark Fish é um ex-zagueiro e ilustre representante dos anos dourados do futebol sul africano.
Fish nasceu em 14 de março de 74, em Cape Town. Portanto, mesmo sendo branco, conheceu o Apartheid de perto. Foi criado pela mãe e pelo padrasto em um pequeno apartamento. Do alto de seu 1,91m, iniciou a vida futebolística em Pretoria como atacante no amador Arcadia Sheperds.
Aos 17 anos Fish foi descoberto pelo técnico Roy Matthews e levado ao Jomo Cosmos, onde se profissionalizou, ainda como centroavante. De olho no grandalhão, Matthews fez dele um zagueiro central, posição em que atuaria até a aposentadoria. A carreira ia de vento em popa e apenas três anos depois veio a transferência para um clube maior, o Orlando Pirates.
Foi nos Pirates que o zagueiro possivelmente alcançou seu auge. O treinador era Mike Makaab e eram tempos abundantes em troféus, com o título sul africano em 94, o bi nacional e a copa dos campeões africanos em 95 e a Copa das Nações Africanas no ano seguinte, justamente na primeira tentativa desde que a Africa do Sul fora autorizada pela FIFA, em 92, a voltar aos torneios oficiais. Em 97 o zagueiro participou da Copa das Confederações, disputada na Arábia Saudita e vencida pelo Brasil de Romário e Ronaldo. Pela seleção nacional, Fish fez 62 aparições e 2 gols.
Com tamanha exposição, a África ficou pequena para o zagueirão. Por incrível que possa parecer, Fish rejeitou um convite de sir Alex Ferguson para jogar em seu time de coração e rumou para Roma, contratado pela Lazio. Após passagem relâmpago pela bota (15 jogos e 1 gol), Mark desembarcou na terra da rainha para receber o maior salário do Bolton. A adaptação foi rápida e logo ele recebeu elogios dos companheiros e rivais, notadamente Andrew Cole. Infelizmente a sorte virou-lhe as costas e o Bolton foi rebaixado. Mesmo assim ele continuou na equipe, para delírio dos fãs.
Em novembro de 2000 Fish deixou o Bolton para jogar no Charlton, cuja camisa ele defendeu em 102 oportunidades, tendo anotado três gols. Cinco temporadas depois, um empréstimo desastroso. Jogando pelo Ipswich Town, bastaram 45 minutos para Big Fish, como ficou conhecido, romper os ligamentos cruzados, contusão que o fez pendurar as chuteiras de maneira prematura.
Após longa recuperação, Mark retornou à Africa do Sul em 2007 para tentar defender seu primeiro clube, o Jomo Cosmos. Fora de forma, não jogou uma partida sequer e reiterou a aposentadoria.
Fora das quatro linhas, Fish tem uma vida bastante midiática. Em 97, casou-se com Loui Fish, ex-modelo de langerie e socialite. Tiveram dois filhos, Luke e Zeke. Em 2006, Fish pediu o divórcio, mas logo em seguida voltou atrás. No ano passado ele entrou com novo pedido de separação e desde então o casal vive se engalfinhando nos tribunais sul africanos, para deleite dos tablóides locais.
Ao regressar ao continente negro, Fish engajou-se em diversas campanhas humanitárias, muitas delas relacionadas à erradicação da pobreza e ao desenvolvimento do futebol local, num programa para crianças de 9 a 12 anos em parceria com o Barcelona. Teve atuação destacada e bem sucedida como embaixador da candidatura sul africana para a Copa de 2010. Ou seja, Fish será figurinha carimbada nos flashs das transmissões no ano que vem.
Para aqueles que temem que a criminalidade afete o próximo mundial, vale lembrar que em agosto passado a casa de Fish em Mooikloof foi invadida e roubada por cinco homens armados (incluindo uma AK-47). Apesar de Loui e Luke Fish estarem na casa, felizmente ninguém ficou ferido.
Ficha
Mark Fish

Data de Nascimento: 14/03/1974
Local de Nascimento: Cape Town, África do Sul<> Clubes que defendeu:
1991-93: Jomo Cosmos

1994-96: Orlando Pirates

1996-97: Lazio (ITA)

1997-2000: Bolton (ING)

2000-05: Charlton (ING)

2005: Ipswich (ING)

2007: Jomo Cosmos


Seleção:Jogos: 62Gols: 2Principais títulos: - Campeonato Sul Africano (1994 e 1995) - Copa dos Campeões da África (1995) - Copa Africana de Nações (1996)

domingo, julho 26, 2009

Relembre o jogador: Dahlin 

“Relembre o jogador: Dahlin”

Uma das estatísticas mais intrigantes envolvendo as Copas do Mundo é aquela segundo a qual pelo menos um dos quatro semifinalistas da última edição sequer se classifica para a próxima. Tem sido assim, de maneira ininterrupta, desde 86, e tudo indica que será assim em 2010, dado o tremendo esforço que Portugal de Carlos Queiroz tem feito para manter a tradição.

Onze anos atrás coube à Suécia manter o tabu. Quatro anos antes, os suecos, liderados por Thomas Brolin e Kennet Anderson, surpreenderam o mundo ao ficarem com o terceiro lugar na Copa dos EUA. Mas aquele time tinha mais que Brolin, Anderson e Larsson. Tinha Martin Nathaniel Dahlin.

Filho de um músico venezuelano de origem africana e de uma psicóloga sueca, Dahlin nasceu em 16 de abril de 68 e foi batizado em homenagem a Martin Luther King, assassinado doze dias antes em Memphis. Apesar de ter nascido em Uddevalla, foi em Lund que ele passou sua infância. Aos dez anos ficou maravilhado diante dos gols de Kempes na copa de 78 e decidiu seguir carreira profissional.

A carreira de Dahlin teve um início tardio (ao menos para os padrões atuais) e um fim prematuro (para qualquer padrão). Ele iniciou sua carreira no Malmo, clube que defendeu entre 1988 e 1991 e onde fez 39 gols em 79 jogos. Sem perder tempo, em seu primeiro ano como profissional o atacante foi convocado para a seleção sueca. Teve seu primeiro encontro com Romário nas olimpíadas de Seul. Quatro anos depois lá estaria Dahlin, disputando a semifinal da Euro-92.

Aos 23 anos o promissor atacante brigou com o Malmo e foi negociado com o Borussia Mönchengladbach, onde permaneceu por cinco temporadas, sendo vice-campeão da copa da Alemanha em 92 a faturando o mesmo troféu em 95, ao lado de Effenberg. Em 93, fora eleito o jogador sueco do ano. Em grande forma, recebeu convite do Everton para ganhar 50% a mais. Rejeitou, pois preferia jogar na Itália ou na Espanha.

1994 foi “o” ano da carreira do jogador. Tudo conspirou para o sucesso da seleção em solo americano: o time era forte, o ambiente era bom e o estilo de jogo encaixava contra o adversário mais difícil, vide o empate na primeira fase e derrota suada para o Brasil na semifinal. Inspirado, Dahlin foi às redes quatro vezes, contra Camarões, Rússia(2) e Arábia Saudita. Além disso, contribuiu com três assistências. De quebra, tamanha semelhança com o ex-jogador de futebol americano O.J. Simpson lhe rendeu o apelido de O.J.

As boas atuações pela seleção e pelo Borussia despertaram o interesse da Roma, para onde Dahlin rumou na temporada 96-97. Contrariando as expectativas, sua passagem pela bota foi relâmpago e decepcionante: três jogos, nenhum gol e passagem de volta para o Borussia. Interessado em disputar um campeonato de primeiro nível, Dahlin teve uma boa temporada na Alemanha e conseguiu uma transferência para o Blackburn Rovers.

Na Inglaterra o atacante manteve o bom futebol e anotou quatro gols em dezenove jogos disputados na temporada 97-98. A temporada seguinte foi decisiva, negativamente, em sua carreira. Uma contusão durante um treino fez com que ele disputasse apenas cinco jogos. Posteriormente, o Blackburn envolveu-se numa controvérsia com a seguradora em torno do reembolso pela contusão do atleta, em caso que teve idas e vindas e culminou em decisão contrária ao clube, que teve que arcar com a bagatela de 4 milhões de libras.

Sendo pouco aproveitado, transferiu-se para o Hamburgo em 1999, onde atuou por uma temporada até anunciar sua prematura aposentadoria, em decorrência da contusão sofrida nos tempos de Blackburn. Encerrou, desta forma, uma bem sucedida carreira, marcada por 123 gols em 267 jogos.

Após pendurar as chuteiras, Dahlin se tornou empresário de jogadores. Representa, entre outros, Markus Rosenberg (Werder Bremen), Ola Toivonen (PSV), Behrang Safari (Basel), Jonas Olsson (West Brom) e Matias Concha (Bochum). Além disso, é dono da marca de roupas, a “Dahlin” (http://www.dahlin.nu/).

Recentemente Dahlin declarou-se um grand fã de Ibrahimovic. No entanto, evitou classificar o craque como o melhor sueco de todos os tempos. Ele diz não gostar de comparar jogadores de gerações diferentes e lembrou de Gunnar Nordahl, artilheiro da Série A por cinco temporadas seguidas nos anos 50. Comparações à parte, o certo é que Dahlin escreveu seu nome na história das Copas.

Ficha
Dahlin

Data de Nascimento: 16/04/1968
Local de Nascimento: Udevalla, Suécia <> Clubes que defendeu:
1988-1991: Malmo-Suécia

1991-1996: Borussia Mönchengladbach-Alemanha

1996-1997: Roma-Itália

1996-1997: Borussia Mönchengladbach-Alemanha

1997-1998: Blackburn Rovers-Inglaterra

1998-1999: Hamburgo-Alemanha


Seleção:Jogos: 33Gols: 20Principais títulos: - Copa da Alemanha (1995)

segunda-feira, julho 20, 2009

Era uma vez em Nasseia 

- Aí ele deu uma carretilha no goleiro e completou de cabeça para selar o placar da final. Foi assim que ganhamos o tetra.
- Ué, Fabinho, mas da última vez você disse que seu primo fez o gol do título de letra
- Você deve estar se confundindo

Fabinho era o menino rico da paupérrima Nasseia, interior do Piauí. Ainda fora das ondas do rádio, Nasseia confiava na família de Fabinho, dona do único jornal da cidade, para saber o que ocorria fora de suas fronteiras. Como quatro em cinco nasseios não sabiam ler, Fabinho praticamente narrava a história do pequeno povoado. Como seis em cinco nasseios eram apaixonados por futebol, não chega a causar estranheza o fato de várias das histórias do guri gravitarem em torno do universo futebolístico.

Foi por intermédio de Fabinho que Nasseia ficou sabendo do jogaço disputado entre Brasil e Polônia na copa de 38, em que Wilimowski marcou quatro vezes e Leônidas anotou sem chuteira. O menino jura de pé junto ter sido carregado nos ombros por Domingo da Guia durante as comemorações.

Além de porta-voz dos acontecimentos externos, Fabinho era generoso nos relatos de causos domésticos. Ninguém esquecia os 1487 gols anotados por Nhô Fernando, avô do menino e fundador do Correio de Nasseia. Ou do tio Adriano, que em viagem a São Paulo ensinou a Leônidas como aplicar uma bicicleta Feito este que fez de titio o presidente do Nasseia Futebol Clube, justamente na época da inolvidável excursão que a equipe fez a Milão para enfrentar a Inter de Giuseppe Meazza em 39. As fotos foram roubadas por ciganos búlgaros em Trieste, mas há quem jure ter visto os ingressos do embate.

Era impressionante a variedade de assuntos dominados pelo pimpolho. Fabinho sabia tudo de rádio, de xadrez, de peão, de bafo, de armadilha para pegar tatu, de buraco em banheiro pra ver menina pelada, de esconderijo no mato e de futebol de botão. Justiça seja feita, o menino era um ás com estas fichinhas. De acordo com o Correio de Nasseia, Fabinho vencera seis dos últimos sete campeonatos piauienses nas modalidades pré-mirim, mirim e infantil.

Tamanho sucesso levou o menino a se arriscar nas peladas da cidade. Rápido, ambidestro, criativo e dotado de instinto goleador, impressionou a todos logo de cara. Passou a jogar com meninos dois anos mais velhos e mesmo assim fazia deles gato e sapato.

Dez meses após arriscar suas primeiras embaixadas, Fabinho reforçou o Nasseinha, tradicional saco de pancadas do campeonato local. Fez a diferença e se tornou um divisor de águas no sertão piauiense. Anotou oito gols em sete jogos e levou o Nasseinha ao título inédito. Coberto de glórias, foi convocado para a seleção estadual.

A ascensão foi meteórica e quando abriu os olhos Fabinho tinha levado o Piauí à final contra o Rio de Janeiro, após atuações de gala contra gaúchos nas quartas e paulistas nas semifinais. O primeiro jogo da decisão foi disputado na capital do país e, sob um verdadeiro dilúvio, os pequenos heróis piauienses seguraram um inacreditável 0x0 em São Januário. Descrente de qualquer possibilidade de hospedar um jogo desta magnitude, a prefeitura de Teresina nem se preocupara em providenciar um estádio, o que causou um deus nos acuda às vésperas da decisão. Após verdadeiro mutirão entre os sertanejos, a pequena Picos foi eleita para receber a finalíssima.

Ironicamente, tamanho esforço foi quase em vão para os nasseios. Os 400 quilômetros que separavam Nasseia de Picos eram quilômetros demais para que os locais pudessem prestigiar seu ídolo mirim. Alheio a tudo isso, o garoto comeu a bola. Em jornada inspirada, Fabinho foi às redes duas vezes, de falta e de cabeça. Os cariocas tinham mais time e empataram o duelo a quatro minutos do fim. O balde de água fria não abateu a seleção do Piauí, que entrou compenetrada na prorrogação. O lance decisivo foi narrado assim por Fabinho aos seus amigos alguns dias depois, no banco da praça de Nasseia:

- O Jaime bateu o tiro de meta curto pra mim. Quando veio o primeiro, enfiei entre as canetas. Disparei e levei o segundo com um drible da vaca. Cruzei a linha do meio de campo e passei no meio de dois. A bola começou a quicar e tirei o volante deles com um chapéu. O zagueiro veio, joguei na frente e, antes de fazer o gol, fintei o goleiro com um drible de corpo. Logo na saída de bola dos cariocas o juiz apitou e ficamos com o título.

O ambiente foi tomado por gargalhadas:

- Fabinho, pelo amor de deus. De todas as suas mentiras, esta consegue ser a mais ridícula. E olha que isto é muito difícil. Ou alguém aqui conhece história de jogador que driblou sete adversários antes de fazer, no final da prorrogação, o gol do título? Não me leve a mal, mas acho mais fácil acreditar naquela do seu tio baixando as calças do Mussolini no estádio do que numa baboseira dessas.

Devastado e sob uma saraivada de risadas, o menino afastou-se e foi jogar futebol de botão contra si mesmo.

A centenas de quilômetros dali, numa roda, quatro garotos jogavam peão e ouviam atentamente um deles contar o que parecia ser um feito e tanto:

- Quando ele colocou na frente, vocês precisavam ver o goleiro se estatelando com o zagueiro. Foi o gol mais lindo que eu vi na minha vida.

segunda-feira, junho 01, 2009

O agnóstico 

Desde criança frequentou toda sorte de culto, do candomblé ao seicho no ie. Influenciado pela mãe, de fé inabalável, encarava qualquer crença como um fato da vida. Rezava, benzia-se ao acordar e, como era de se esperar, foi matriculado em escola católica. Meio que na inércia, faria primeira comunhão e crisma, chegando até a participar de um encontro de jovens. Gostava das aulas de religião, quando ficava fascinado por milênios de história de rica simbologia. Aos oito anos, descobriu-se um apaixonado por futebol e começou a relacioná-lo à religião que tão fortemente o impregnava.

Eram anos estéreis em termos de conquistas para a seleção canarinho e, como se sabe, fé e dificuldade andam de mãos dadas. Avizinhava-se a Copa da Itália e ele, do alto de seus dez anos, percebia que algo não ia bem entre os comandados de Lazaroni, talvez em decorrência do episódio em que os jogadores cobriram a marca da empresa patrocinadora em algumas fotos. Lamentou quando viu o cruzamento das oitavas de final e assistiu ao jogo na companhia de mais de trinta convidados que sua mãe convidara para uma festa em casa. Considerou tudo aquilo um sacrilégio, copa do mundo era coisa séria demais pra ser assistida em meio a Ray Conniff, Camparis e canapés. No fundo, sabia que o Brasil passava por uma entressafra de talentos.

Três anos se passaram e vieram as famigeradas eliminatórias e o fantasma da eliminação diante do Uruguai no Maracanã. Nosso guri era então adolescente e encantou-se com a rebeldia de Romário, que esbanjou genialidade e colocou o Brasil na copa. Começava ali uma admiração que transcendia a relação ídolo-fã.

Prometera levar a copa mais a sério e assim o fez. Leu todos os guias de cabo a rabo, assistiu a todos os jogos e acompanhou o escrete com devoção total. Antes dos jogos, rezava e fazia promessas. Depois, pagava-as com juros e prontidão. Acreditava piamente que a fé do povo, a começar pela sua, traria o caneco depois de longos 24 anos. Curiosamente, jamais flertou com a superstição, esta prima distante da religião.

A conquista, da maneira hercúlea como aconteceu, corroborou a certeza de que reza ganha jogo. Romário, como ele suspeitava, era mesmo o Messias que surgira da Vila da Penha para redimir o país do futebol. Jamais se esqueceria de sua mãe rezando no terraço enquanto Taffarel entrava em ação no Rose Bowl.

Entre os catorze e os dezoito anos, tempos confusos. Fora de campo ele leu muito e adquiriu convicções socialistas, segundo as quais a religião é o ópio do povo. Leu Descartes, que explicou matematicamente a existência de Deus. Leu Darwin, Nietzsche e Freud, acusados de serem os assassinos de Deus. Dentro de campo, passou a jogar em nível mais competitivo. Quando se contundia, rezava para acelerar a recuperação. Antes dos grandes jogos, fazia promessas, invariavelmente cumpridas depois. Ficava nebulosa a fronteira entre força mental e fé, possivelmente sinônimos. No fundo, ainda acreditava.

Foi quando pediu, como presente por ter entrado na faculdade, para assistir ao mundial da França in loco. 94 lhe enchera de esperança e tudo indicava que Romário e Ronaldo levariam o Brasil ao penta. O corte do primeiro o levou aos prantos em público, diante da coletiva em que o Baixinho, o Messias, chorou como criança. Ronaldo voava baixo e haveria de honrar o genial parceiro de ataque.

O time era instável e ele retomou a rotina de rezas e promessas. Chile, Dinamarca, Holanda, este o jogo mais sensacional de sua vida. A vitória nos pênaltis confirmava a força da fé. Naquela noite, quadruplicou as promessas tendo em vista o duelo de 12 de julho.

Vieram o desastre, a humilhação e a decepção. Diante da maior tristeza de sua vida, voltou ao hotel e simplesmente concluiu que Deus não existia. Mandou as promessas, o terço e a fé às favas e converteu-se ao agnosticismo.

A copa da Ásia de certa forma vitaminou a aversão adquirida quatro anos antes. Afinal, ele viu a família Scolari ganhar os sete jogos de junho sem a necessidade de uma ave-maria sequer. Na final, encontrou-se com os amigos num churrasco e, como que extravasando o rancor de Saint Denis, apontou para Ronaldo no vídeo e vociferou diante dos quarenta convidados presentes: “este cara fez mais por mim do que Jesus”.

Algumas pessoas acreditam num fenômeno chamado de “crise de um quarto da vida”, que costuma acometer as vítimas em torno dos vinte e cinco anos de idade. Nosso personagem parece ter passado por ela. Após os 24 anos, sentiu-se mais maduro e começou a olhar a vida de outra forma, incluindo o futebol. Isto não impediu que sofresse a habitual “tensão pré-copa”, quando a contagem regressiva para o torneio da Alemanha culminou numa ansiedade insuportável. Em meio ao choque de realidade, percebeu o oba-oba que reinava no grupo de Parreira e lembrou-se de outro oba-oba, aquele na sala de sua casa dezesseis anos antes.

Consumiu avidamente o torneio, e salivou diante do prato frio da vingança a ser saboreado nas quartas de final. Sucumbiu diante de Zidane, chorou que nem criança novamente e, num momento de reflexão, percebeu que religião e futebol são um fenômeno da mesma natureza, que atendem a mesma necessidade humana, mas que não, Deus não é o menino do placar.

Recentemente nosso amigo esteve na Índia e desde então tem dedicado um bom tempo contemplando o Cristo Redentor. Inveja as pessoas de fé e voltou a pensar em Deus, desta vez sem chuteiras. Aposta suas fichas na Argentina na copa da África e sonha em ser campeão do mundo em um Maracanã lotado.

domingo, maio 17, 2009

Resenha Guia Placar Brasileiro 2009 

Por diversos motivos, o Brasileirão deste ano promete. Craques repatriados, mercado externo fechado em virtude da crise, tricampeão a ser desbancado, fartura de candidatos ao título, time de segunda maior torcida voltando de uma temporada na série B.

Para dar uma mãozinha, o formato de pontos corridos parece se consolidar e deixar o planejamento mais fácil, seja para os clubes, que finalmente começam a vender pacotes de ingressos para os jogos em casa, seja para a mídia, que aprimora a cobertura do torneio.

Some-se a isso o fato de, conforme comentado neste espaço algumas vezes, o mercado editorial em torno do futebol ter evoluído significativamente nos últimos dez anos. Os guias do campeonato brasileiro dão uma boa dimensão disso, com mais variedade e concorrência em 2009. Foi neste terreno fértil e competitivo que a revista Placar lançou seu tradicional guia do campeonato brasileiro.

Incomodada por concorrentes diretos como Lance e Globo Esporte, a publicação traz algumas inovações gráficas, detalhes como autógrafo digitalizado dos jogadores e legendas para indicar destros e canhotos. Isso tudo sem abrir mão da habitual enxurrada de informações. De fato o material é riquíssimo em detalhes e estatísticas, cobrindo as três principais divisões do nosso futebol.

Completo por um lado, mal revisado por outro. Para uma publicação deste gabarito, o guia vem repleto de erros banais (perdi a conta após o 20º), contradições e descuidos, via de regra envolvendo dados históricos, mas também abrangendo aberrações como trocar o escudo do Vitória pelo do São Paulo. O leitor detalhista, perfeccionista ou de boa memória certamente ficará incomodado. O mais afeito a números e estatísticas consistentes, sairá desconfiado ou até mesmo descrente.

Além de ter negligenciado os detalhes de seu guia, Placar traz um material excessivamente sério e de certa forma carente de análises. Tivesse se aprofundado na parte tática, inserido um pouco mais de opinião ou temperado a edição com algumas pitadas de humor, a revista faria ainda mais sucesso. Outra desvantagem, esta tão cruel quanto verdadeira, é a desatualização, por motivos óbvios e compreensíveis, frente aos guias em formato digital publicado por sites e blogs.

Em suma, o guia atinge o objetivo de informar, com extrema riqueza de detalhes, os torcedores interessados em saber mais sobre o campeonato brasileiro. É completo, abrangente e graficamente interessante. No entanto, a recente sofisticação do mercado editorial relacionado ao futebol eleva o nível de exigência do leitor. Não basta mais recauchutar formatos e conteúdos de anos anteriores, apostando em sucessos do passado. Placar deve estar atenta a isso se quiser manter seu domínio na publicação de Guias do Brasileirão.

domingo, abril 05, 2009

“20 anos da Copa do Brasil” 

Morno. Assim pode ser definido o livro “20 anos da Copa do Brasil. De Kaburé a Cícero Ramalho”, de Marcelo Migueres e Alex Escobar. Diante de rica matéria prima e da “data redonda”, os autores entregam uma obra correta, fruto de dedicada pesquisa e visualmente interessante. E só.

O torneio é pródigo em pelo menos três aspectos: seu caráter democrático; as zebras homéricas que permeiam sua história, típica de um mata-mata; e os causos inusitados que o cercam, muito em razão de ser disputado frequentemente nos grotões do país. Pois bem, o livro de Migueres e Escobar explora razoavelmente bem o primeiro aspecto, enquanto o segundo e o terceiro são, de certa forma, negligenciados. O próprio subtítulo, “De Kaburé a Cícero Ramalho” gera uma expectativa, em torno das excentricidades do torneio, que acaba não correspondida.

Mesmo com essas ressalvas, o livro reflete um trabalho intenso de pesquisa dos autores. A parte sobre clubes que disputaram o torneio e hoje não existem mais merece destaque. Curiosamente, um dos exemplos utilizados, o Malutrom-J.Malucelli está se convertendo em um terceiro, o Corinthians Paranaense. O levantamento acerca das mascotes dos participantes segue a mesma linha de pesquisa minuciosa com resultados interessantes, assim como a escalação dos atletas com nomes e/ou apelidos mais bizarros de cada edição.

Já a lista dos artilheiros do torneio, estrelada por nomes como Bizu, Dauri e Victor Simões, é muito mais exótica do que a do Brasileirão. Há observações interessantes, como o fato do critério de desempate pelos gols anotados fora de casa, original de fábrica do torneio, ter sido copiado por primos ricos como a Liga dos Campeões. Ou pelo ineditismo da decisão por pênaltis na finalíssima, mesmo após 20 edições.

O livro prima também pela alta qualidade presente em sua apresentação gráfica, comprovada pelas imagens utilizadas, que quebram um pouco o gelo e emprestam informalidade à obra. O senso de humor carioca dos autores também colabora para isso.

Com relação às zebras e aos causos pitorescos envolvendo o torneio, o livro é extremamente superficial e burocrático, optando por listar inúmeros casos, vários irrelevantes, em vez de se aprofundar no lado mais insólito da competição. Impossível não comparar com a excelente série de reportagens produzida recentemente pela ESPN Brasil (“O Brasil da Copa do Brasil”).

As estatísticas apresentadas repetem o tom frio e burocrático presente ao longo do livro. Em vez de dar destaque, por exemplo, aos 49 gols sofridos pelo Operário-MS em cinco jogos, os autores despejam uma infinidade de números que poderiam meramente constar no final do livro para consulta.
Em suma, o livro está longe de ser ruim, mas em nenhum momento prende o leitor. O que é uma pena, pois estamos falando de um torneio rico em emoção (preenche a lacuna dos campeonatos disputados em formato eliminatório), e repleto de histórias a serem contados Fica a impressão de que uma grande oportunidade poderia ter sido mais bem aproveitada.

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