terça-feira, junho 03, 2014
“Fez mais por mim do que Jesus” – Japão/Coréia 2002
“O dia em que Deus morreu” – França 98
“A perda da virgindade” – EUA 94
sexta-feira, julho 02, 2010
Dr. Jeckyll e Mr. Hyde
O Brasil entrou bem postado, compacto, criativo e não é exagero dizer que poderia ter marcado três vezes e liquidado a fatura. No segundo tempo demonstrou um destempero emocional inaceitável para uma equipe tão experiente (arrisco que nem três titulares chagarão a 2014), materializado na tragédia anunciada do bipolar Felipe Melo. Justiça seja feita, pode-se dizer que Felipe Melo foi o único jogador presente nos quatro lances capitais da partida, mas não que tenha decidido o jogo. No máximo, sepultou a recuperação. O Brasil já tinha voltado atordoado para o segundo tempo e o lance do primeiro gol holandês foi uma infelicidade de Julio César. Jogos parelhos são decididos nos detalhes.
Se contra o Chile a vitória foi construída nos pontos fortes da era Dunga, hoje a derrota veio justamente na bola aérea (terceira eliminação seguida do Brasil em lances de bola parada) e em falha do melhor goleiro do mundo. O time entrou em pane, o contra-ataque não encaixou e sequer conseguimos chegar na base do abafa. A Holanda mostrou-se equilibrada, não se abalou com o mau primeiro tempo e tampouco recuou excessivamente após virar o placar. Poderia, inclusive, ter saído com uma vitória mais elástica, em lances no final do jogo que mais pareciam casados x solteiros em churrasco.
Sempre acreditei que atravessávamos uma entressafra onde os poucos medalhões tinham problema de postura (Ronaldinho e Adriano) e os jovens talentos não foram testados a tempo. Dentro deste cenário, o Brasil montou uma seleção competitiva e comprometida, que está hoje entre as quatro melhores do mundo, mesmo que o chaveamento da Copa não permita que isso ocorra na prática.
Avaliando os jogadores, a defesa dispensa comentários (Lúcio e Juan falharam quando todo o time já tinha entrado em parafuso), Michel Bastos não reviveu Zé Carlos-98 e os volantes fizeram até mais do que deles se esperava. Elano e Dani Alves são opostos no que diz respeito a render mais pelo time ou pela seleção, a contusão do ex-santista foi uma perda significativa. Ninguém questiona o talento de Dani Alves, mas definitivamente seu estilo não é compatível com o esquema de Dunga. Prende excessivamente a bola e abusa do individualismo, matando assim a saída rápida e a troca de passes em velocidade.
Kaká é um caso à parte. Seu mundial não foi um fiasco, mas eu esperava que crescesse dentro da competição a ponto de ser decisivo, o que não ocorreu. Seu quadro clínico definirá se estará presente em 2014. Robinho tem lampejos geniais, mas não é um fora de série. O erro de muitos é esperar dele um novo Garrincha. Luis Fabiano, por fim, é um jogador esforçado e decisivo, mas é duro substituir Careca, Romário e Ronaldo, mestres do fundamento que diferencia o Brasil dos demais.
Dunga teve méritos em recuperar o espírito competitivo e a dignidade, além de montar um esquema letal que explorava a potencialidade de seus parcos talentos. Seus deméritos são a baixíssima inteligência emocional (que certamente contagia a equipe, pilhada em campo), a ausência de alternativas táticas, o imediatismo e algumas falhas na convocação, principalmente para o meio de campo. Ao seguir à risca o princípio da gratidão (vide Júlio Batista), montou um grupo que não lhe oferecia opções de qualidade quando precisava alterar a situação do jogo. Em tempo, acho uma perda de tempo discutir se a concentração deve ser oba-oba ou clausura, não acho que isso em si defina o resultado. Não defendo que Dunga deva permanecer, mas também não acho que tenha feito um papelão como fizemos em 66, 90 e, em menor escala, em 2006.
Em retrospectiva, o Brasil foi levemente melhor que 2006 (com um elenco muito pior), em especial na postura diante da derrota. Não senti hoje a vergonha de 1º de julho de 2006. Também discordo de quem vê neste time o estilo de 94. Basta ver os gols do Brasil para constatar que apresentamos um futebol melhor do que nos Estados Unidos.
Olhando pra frente, temos uma janela de renovação, pois o que fizemos de 2006 para cá foi substituir jogadores com problema de comportamento por outros mais esforçados e unidos, mas este time é até mais velho que o de quatro anos atrás. São poucas as opções para substituir Dunga, não acho que devamos inovar no banco e em campo ao mesmo tempo e desta forma Felipão me parece ser a melhor alternativa, resta saber se o gaúcho está disposto. Historicamente as seleções são compostas por jogadores que se surgiram entre quatro e oito anos antes da copa, basta ver que agora tivemos em campo a geração que emergiu em 2002. Dito isso, chegou a hora de Thiago Silva, Ramires, Ganso, Neymar, Philippe Coutinho, Pato e companhia. Não temos eliminatórias, já somos favoritos e ninguém quer reviver o Maracanazo.
segunda-feira, junho 28, 2010
Não pedala, Robinho
Foi então que a primeira marca registrada do time de Dunga apareceu. Bola aérea, Juan e rede. Eu adoro o delay da TV digital quando o gol é brasileiro, quebra a ansiedade. Falando em marca registrada, o Chile mostrou a sua: toma o gol, se atira pro ataque sem recursos e cede o contra-ataque. Bola roubada, esticada pro Robinho, o Galvão grita “pedala, Robinho” e eu respondo “não escuta ele, não pedala, Robinho”. Ele me escuta, joga objetivamente, Kaká dá uma assistência genial e Luis Fabiano faz o que sabe como poucos (reparem como ele não perde gols). Fim de jogo.
No segundo tempo tivemos a pá de cal em arrancada de Ramires, o queniano. Robinho fez o gol, mas dos três talentos foi o de pior atuação. Jogo em banho maria, nos permitindo poupar os talentos e observar a maturidade do time brasileiro que, se não é brilhante, é extremamente sólido, equilibrado, mentalmente forte e competitivo. Difícil de ser batido.
Em termos individuais, Maicon foi neutralizado pelo plano de Bielsa, a zaga foi segura como sempre, Michel não comprometeu, Gilberto Silva segue firme, Daniel Alves errou muitos passes, alternando bons e maus momentos, Ramires foi o elemento surpresa e Kaká mostrou evolução satisfatória. Pode fazer mais. Quanto ao Chile, é duro quando o craque está no banco.
Não devemos temer a Holanda. O estilo de jogo é compatível com o nosso, entendo que temos leve vantagem, é de se esperar um jogo aberto naquele que será o primeiro teste para separar os homens dos meninos. Do outro lado da chave, o “fator Messi” definirá o vencedor e um dos finalistas da Copa. De qualquer modo, a taça já estará em melhores mãos do que quatro anos atrás.
Não pedala, Robinho
Foi então que a primeira marca registrada do time de Dunga apareceu. Bola aérea, Juan e rede. Eu adoro o delay da TV digital quando o gol é brasileiro, quebra a ansiedade. Falando em marca registrada, o Chile mostrou a sua: toma o gol, se atira pro ataque sem recursos e cede o contra-ataque. Bola roubada, esticada pro Robinho, o Galvão grita “pedala, Robinho” e eu respondo “não escuta ele, não pedala, Robinho”. Ele me escuta, joga objetivamente, Kaká dá uma assistência genial e Luis Fabiano faz o que sabe como poucos (reparem como ele não perde gols). Fim de jogo.
No segundo tempo tivemos a pá de cal em arrancada de Ramires, o queniano. Robinho fez o gol, mas dos três talentos foi o de pior atuação. Jogo em banho maria, nos permitindo poupar os talentos e observar a maturidade do time brasileiro que, se não é brilhante, é extremamente sólido, equilibrado, mentalmente forte e competitivo. Difícil de ser batido.
Em termos individuais, Maicon foi neutralizado pelo plano de Bielsa, a zaga foi segura como sempre, Michel não comprometeu, Gilberto Silva segue firme, Daniel Alves errou muitos passes, alternando bons e maus momentos, Ramires foi o elemento surpresa e Kaká mostrou evolução satisfatória. Pode fazer mais. Quanto ao Chile, é duro quando o craque está no banco.
Não devemos temer a Holanda. O estilo de jogo é compatível com o nosso, entendo que temos leve vantagem, é de se esperar um jogo aberto naquele que será o primeiro teste para separar os homens dos meninos. Do outro lado da chave, o “fator Messi” definirá o vencedor e um dos finalistas da Copa. De qualquer modo, a taça já estará em melhores mãos do que quatro anos atrás.
domingo, maio 30, 2010
Relembre o jogador - Zé Carlos
Zagallo também fez sua parte e em 98 convocou Zé Carlos para a reserva de Cafu. “Ah, mas o Cafu tem quatro pulmões e leva poucos cartões, o reserva dele nunca jogaria de qualquer maneira”, pode pensar o leitor mais desavisado. Zé Carlos não só jogou, como o fez na semifinal da Copa diante da Holanda de Seedorf, Davids, Bergkamp e Kluivert. Atuação pra Galvão “Haja Coração” Bueno nenhum botar defeito.
José Carlos de Almeida é paulista de Presidente Bernardes e nasceu em 14 de novembro de 1968. Iniciou a carreira no São José-SP aos 21 anos. Do interior emigrou para a capital, onde defendeu o Nacional por duas temporadas. Na sequência, iniciou uma trajetória cigana, passando por São Caetano, Portuguesa, União São João, Juventude e Matonense, nunca ficando mais de um ano em cada equipe.
1997 foi um divisor de águas na carreira do atleta. Zé Carlos teve participação decisiva na campanha que resultou na promoção da Matonense da série B para a primeira divisão paulista. Atraiu a atenção do São Paulo e realmente não tinha ideia do que o aguardava. A bola de prata da revista Placar no mesmo ano era só o começo.
Comandado por Nelsinho Batista e ao lado de Raí(na final), França e Denílson, fez um excelente campeonato paulista em 98, conquistando o título e dando a impressão que poderia resolver a carência na reserva da lateral direita da seleção de Zagallo.
Mantendo a sina de Forest Gump, Zé Carlos estva no lugar certo na hora certa. Flávio Conceição, nome certo pro torneio, contundiu-se e o lateral tricolor foi convocado pro mundial sem ter atuado um minuto sequer pela seleção brasileira. Na época a convocação foi elogiada por parte da imprensa em virtude da versatilidade apresentada pelo jogador. De quebra levou a camisa 13, número predileto do velho lobo.
Zé Carlos fez as malas e embarcou para a França para juntar-se a Rivaldo, Roberto Carlos, Ronaldo e Bebeto. Boa praça, destacou-se nos treinamentos...como excepcional imitador de animais. Suas especialidades eram o papagaio e o galo. Nas horas vagas jogou futebol na semifinal da Copa, dia 7 de julho em Marselha contra a Holanda que havia eliminado a Argentina dias antes. Para quem morava e trabalhava em Matão um ano antes, a realidade tinha mudado bastante.
A atuação de Zé Carlos foi sofrível, assim como a de todo o sistema defensivo brasileiro. Envolvido pela movimentação constante de Zenden e Bergkamp, o lateral saiu atordoado de campo. Humilde, o jogador reconheceu que não foi bem, comemorou a classificação e lamentou o título perdido na final contra os donos da casa. A propósito, Zé Carlos era vizinho de quarto de Ronaldo na concentração e foi um dos primeiros a socorrer o atacante no lendário episódio da convulsão.
Terminada a copa, o lateral encerrou sua breve passagem pela seleção (2 jogos) e voltou ao São Paulo, onde permaneceu por mais uma temporada. No ano seguinte passou a vestir a camisa do Grêmio, que trocou pela da Ponte Preta, seguindo pro Joinvile até encerrar a carreira no Noroeste-SP em 2005.
Após pendurar as chuteiras, Zé Carlos voltou a Presidente Bernardes para ajudar na revelação de novos talentos. Atualmente mora em Osasco e trabalha num projeto social.
Os fãs de Trivela na Argentina deveriam guardar este texto. Vocês podem precisar dentro de alguns anos. Afinal, Diego Maradona convocou para a Copa Ariel Garcé, lateral de 30 anos do Colón, após uma exibição de gala num amistoso contra o Haiti. Se o raio cair duas vezes no mesmo continente, caberá a Garcé marcar Fernando Torres numa eventual semifinal, coincidentemente, no dia 7 de julho.
Zé Carlos
Data de Nascimento: 14/11/1968
Local de Nascimento: Presidente Bernardes-SP<>
Clubes que defendeu:
1990-1990: São José-SP
1991-1992: Nacional-SP
1993-1993: São Caetano-SP
1994-1994: Portuguesa-SP
1995-1995: União São João-SP
1996-1996: Juventude-RS
1997-1997: Matonense-SP
1997-1999: São Paulo
1999-1999:Grêmio
2000-2000: Ponte Preta-SP
2001-2001: Joinville-SC
2002-2002: Noroeste-SP
2002-2004: Joinville-SC
2005-2005: Noroeste-SP
Principais títulos:
- Campeão Paulista (1998)
- Campeão Gaúcho (1999)
- Campeão Catarinense (2001)
domingo, maio 23, 2010
O olheiro
Quis o destino que o caminho de Fábio no vestibular da bola fosse mais tortuoso do que o esperado. Campo elameado, ligação direta defesa-ataque, e nada do habilidoso meia mostrar serviço. Tomou pau. Veio a segunda peneira e novamente o acaso lhe driblou, colocando um semi-Maradona para competir com ele pela mesma vaga.
Pensando em Cafu e suas dez tentativas, Fábio não esmoreceu. Perseverou e na terceira peneira veio a fatalidade: ligamento cruzado rompido. Duas cirurgias e dez meses de fisioterapia depois, o rapaz era apenas um mal acabado rabisco do craque que um dia fora. Pendurou as chuteiras que nunca calçou.
Ocorre que o rapaz estava tão obcecado com sua promissora carreira que ele simplesmente não tinha um plano B. Tinha deixado o colégio na 6ª séria e nem cogitava voltar a estudar, nao tinha a menor aptidão para qualquer outra atividade e, de quebra, tinha uma relação mal resolvida com o futebol que já beirava a fixação. Depois de muito pensar, decidiu ser olheiro e viajar pelo Brasil afora.
Arruinando talentos. Isso mesmo. Fábio passou a farejar talentos para literalmente perseguí-los e, por meio de conchavo, suborno, politicagem, sabotagem, difamação e outros expedientes da mesma nobreza, garantir que nenhum menino de talento fosse aprovado nas peneiras em que ele participava. Seus relatórios mais pareciam sentenças do julgamento final: “mascarado”, “franguinho”, “sem inteligência emocional”, “fominha”, “bichado”, “laranja podre”, “sem futuro”, “enganação”. Sua caneta cuspia sangue.
Depois de um certo tempo na profissão, Fábio construiu uma rede de contatos que lhe permitiu cobrir o Brasil inteiro. Tão logo soubesse de um craque em potencial, se deslocava o mais rápido possível para participar da peneira e vetar o jovem talento. Com isso, ganhou reputação de exigente e passou a ser requisitado. Arrogante, gostava de se gabar e a ele era atribuída uma espécie de seleção fúnebre: já havia vetado um “quase-Zico”, um “quase-Rivaldo”, um “quase Kaká”, entre outros quases. Comenta-se no Pará que sua vítima mais recente colocava o Paulo Henrique Ganso no bolso.
E foi justamente quando estava no Pará que ele recebeu uma ligação de um de seus inumeros auxiliares: “Fábio, corre pra cá. Apareceu um moleque na várzea aqui em São Paulo que você não pode perder. O moleque é fera e a peneira é no sábado de manhã”.
Sedento por mais uma sentença de morte, Fábio chegou em São Paulo às pressas, nem passou em casa e foi direto pro campinho de várzea. Confiando em seu auxiliar, manipulou a situação de modo que a decisão de aprovar ou vetar os meninos naquela manhã fosse sua.
“É aquele ali”, apontou o auxiliar. “Dizem que perto dele o Djalminha seria um cabeça de bagre”. Fábio fixou o olhar no jovem camisa 10 e naquele instante alienou-se de tudo ao seu redor. Em transe, ignorou os auxiliares e os demais jogadores e fitou incansavelmente aquele meia esquerda: que classe, que visão, que personalidade, que capacidade de decisão. Estava diante do maior jogador que já vira em 25 anos como olheiro.
Terminada a partida, Fábio estava visivelmente perturbado. “Está aqui a ficha dele, acaba com ele”, lhe disse o responsável pela peneira. “Preciso de cinco minutos”, respondeu Fábio. Consternado, dirigiu-se ao vestiário, ligou o chuveiro e enfiou a cabeça embaixo da água gelada. Naqueles longos três minutos, sua vida toda lhe passou pela cabeça: os primeiros chutes, os títulos, o pai sacaneando o vizinho, as peneiras malditas, a cirurgia, a vida de olheiro, o casamento, os dois filhos, o falecimento do pai.
Voltou ao campo compenetrado, pediu a ficha e, convicto, vetou o meia esquerda: “firulento e muito fraco fisicamente. Não tem potencial”.
Ao deixar o campo, encontrou a mulher e os dois filhos no estacionamento. Eufórico e ainda vestindo a dez, Leozinho se virou ao pai e disse:
- “Você viu o jogo, pai? Todo mundo disse que eu arrebentei, acho que consegui uma vaga aqui no Corinthians, vou ser profissional”.
- “Vamos ver, Leozinho. Vamos ver”.
domingo, abril 18, 2010
Relembre o jogador - Dadá Maravilha
Dario é carioca e nasceu em 4 de março de 1946. Sua infância e juventude foram traumáticas. Aos 5 anos assistiu ao suicídio da mãe e foi internado pelo pai no Serviço de Assistência aos Menores (SAM), onde ficaria pelos próximos 14 anos. Ainda adolescente, tentou se matar.
Antes de se tornar goleador, foi detido por furto aos 19 anos. O que poderia ter significado a ruína foi na verdade sua salvação. Foi na Febem que Dario iniciou-se no futebol. No mesmo ano ele passou a integrar os juniores do Campo Grande, profissionalizando-se (tardiamente, para os padroes atuais), dois anos depois.
Os gols chamaram a atenção e em 68 Dadá desembarcava em Belo Horizonte para defender o Galo. No ano seguinte viria a polêmica: o presidente Medici, atleticano fervoroso, estaria pressionando o técnico João Saldanha a convocar e escalar Dadá Maravilha na seleção brasileira. Comenta-se que o treinador até apreciava o futebol decisivo do centroavante desengonçado, mas diante da pressão presidencial saiu-se com algo do gênero “eu não me meto na escalação do ministério, ele que não se meta na escalação da seleção”.
Não por causa do incidente, Saldanha caiu e Zagalo assumiu, convocando Dadá, artilheiro do campeonato mineiro, para o mundial. Mais uma confirmação da estrela do jogador, que no ano seguinte igualaria-se ao helicóptero e ao beija-flor, parando no ar para fulminar o Botafogo no Maracanã e levar o título do primeiro campeonato brasileiro para as Alterosas.
Dadá completou sua quinta temporada pelo Galo em 72 e decidiu cair na estrada. Nos 14 anos seguintes, defenderia 14 equipes diferentes. Fora de Minas, brilhou com a camisa do Colorado ao fazer o gol do bicampeonato brasileiro sobre o Corinthians, justificando sua contratação a peso de ouro para os valores da época.
Nas horas vagas, Dadá era frasista inveterado, sendo atribuídas a ele perólas como: "Não existe gol feio. Feio é não fazer gol.";"Nunca aprendi a jogar futebol pois perdi muito tempo fazendo gols"; "Num time de futebol existem nove posições e duas profissões: o goleiro e o centroavante"; "Quando eu saltava o zagueiro conseguia ver o número da minha chuteira";” Dentro da área não houve, não há e não haverá igual Dadá: ele tem o olhar balístico da águia, a velocidade do Falcão e a impiedade do abutre”.
Filosofia à parte, Dario deixou seu nome marcado na história do futebol brasileiro. Na carreira longeva foram quatro artilharias do campeonato minineiro, três do Brasileiro, 10 gols numa única partida e a bagatela de 926 na carreira, sendo 499 de cabeça.
Dadá pendurou as chuteiras aos 40 anos e arriscou-se brevemente como técnico, treinando a Ponte Preta e o Brasília, além do título Amapaense pelo Ypiranga. Abandonada a prancheta, e como era de se imaginar, tem sido muito disputado como comentarista esportivo na tv mineira.
Dadá Maravilha
Data de Nascimento: 04/03/1946
Local de Nascimento: Rio de Janeiro<>
Clubes que defendeu:
1967-1968: Campo Grande-RJ
1968-1972: Atlético-MG
1973-1974: Flamengo
1974-1974: Atlético-MG
1974-1975: Sport Recife
1976-1978: Internacional-RS
1978-1979: Ponte Preta-SP
1979-1979: Paysandu
1980-1980: Náutico
1981-1981: Santa Cruz
1981-1982: Bahia
1982-1983: Goiás
1983-1984: Coritiba
1984-1984: Bahia
1984-1985: Atlético-MG
1985-1985: Nacional-AM
1985-1986: XV Piracicaba-SP
1986-1986: Douradense-MS
1986-1986: Comercial de Registro-SP
Principais títulos:
- Campeão Mundial (1970)
- Campeão Mineiro (1970)
- Campeão Brasileiro (1971)
- Campeão Pernambucano (1975)
- Campeão Gaúcho (1976)
- Campeão Brasileiro (1976)
- Campeão Mineiro (1978)
- Campeão Baiano (1981)
- Campeão Goiano (1983)
- Campeão Amapaense (Como Técnico-1994)
segunda-feira, março 08, 2010
Voo de galinha - Totó Schillaci
Esperança, Ronaldinho, pode haver luz no fim do túnel. 20 anos atrás um homem chamado Salvatore Schillaci fez sua primeira partida pela seleção italiana em 31 de março. Ou seja, 69 dias antes da abertura da Copa da Itália. Não satisfeito com a convocação meteórica, “Totó” gravou seu nome na história dos mundiais ao sagrar-se artilheiro do torneio. Podia até não ser o homem certo, mas estava no lugar certo, na hora certa.
Nascido e criado no bairro pobre de San Giovanni Apostolo, em Palermo, Schillaci iniciou sua empreitada futebolística no amador Amat. Em 82, então com 17 anos, assinou seu primeiro contrato profissional com o Messina. E lá permaneceu, acreditem ou não, pelas 7 temporadas seguintes, aventurando-se pelas séries B e C da bota. Com isso tornou-se o jogador com maior número de partidas na história do clube. Nada muito notório.
Caminhava fortemente para o anonimato, quando transferiu-se em 89 para a Juve. Estreou na série A pouco mais de 9 meses antes da Copa. Clube novo, vida nova. Pela Juve, Shillaci desandou a fazer gols (15) e ganhou a Copa da Itália e a Copa da UEFA, convencendo Azeglio Vicini a convocá-lo para o mundial. Era a chance de sua vida.
E Totó agarrou-a como poucos. Aproveitando-se do mau momento de Viali e da infertilidade do ataque italiano, ele substituiu Carnevale aos 36 do segundo tempo da estreia contra a Austria e precisou de apenas dois minutos para marcar o gol da vitória. Atuando como titular, marcou contra a Tchecoslovaquia na terceira rodada e contra o Uruguai nas oitavas, este o mais belo dos gols que fez na Copa.
Nas quartas, novo gol contra a Irlanda. Graças a isso, anos depois Totó atuaria em uma propoaganda para uma famosa cerveja irlandesa.O comercial remetia ao gol de Totó e à vitória irlandesa contra a Itália na Copa seguinte.
Com gols decisivos contra Argentina (semifinal) e Inglaterra (disputa de 3º lugar), Schillaci levou pra casa a chuteira de ouro da FIFA e encerrou o mês mais sensacional de sua vida (muitos italianos se referem à Copa de 90 como “as noites mágicas de Totó Schillaci”). Seu sucesso foi tão efêmero que o jogador carrega a inusitada marca de sete gols pela seleção nacional, seis deles durante uma Copa do Mundo. Por pouco não se tornou o heroi de um titulo italiano em casa.
Após seus 30 dias de Cinderela, atuou por mais uma temporada pela Juve antes de se transferir para a Inter, onde jogou por dois anos, sem brilho. Decidiu então cruzar o mundo e transformou-se em “Toto-San”, o primeiro italiano a disputar a J-League. Foi ídolo do Júbilo Iwata durante quatro temporadas. Dono de uma estrela rara, encerrou sua carreira (que pela fugacidade lembra um voo de galinha) em 1999.
Hoje Totó é dono de uma escolinha de futebol em Palermo e apresenta um programa esportivo na RAI. Em 2004 voltou aos holofotes ao participar do reality show L'isola dei famosi.
Salvatore Schillaci
Data de Nascimento: 01/12/1964
Local de Nascimento: Palermo, Itália<>
Clubes que defendeu:
1982-1989: Messina-ITA
1989-1992: Juventus-ITA
1992-1994: Inter de Milão-ITA
1994-1998: Jubilo Iwata-JAP
Principais títulos:
- Copa UEFA (1990)
- Copa da Itália (1990)
- 3o lugar na Copa do Mundo (1990)
domingo, janeiro 24, 2010
Relembre o jogador - Mauro Silva
Aquela decisão projetou nomes como Vanderlei Luxemburgo, Luis Carlos Prima, Nelsinho Batista, Luis Carlos Goiano, Gil Baiano, Robert, Sílvio e os futuros campeões do mundo em 94 Paulo Sérgio, Márcio Santos e Mauro Silva. Com diferente intensidade, frequência e duração, todos brilharam, mas nosso destaque hoje vai para o volante cuja história está intimamente entrelaçada à do Deportivo La Coruña. A incrível história de um jogador que só atuou em times pequenos, que marcou um gol em 430 partidas disputadas e que mesmo assim exibe um currículo pra lá de vitorioso.
Mauro é natural de São Bernardo, filho de um eletricista e caçula de 3 irmãos, e completou 42 anos no último dia 12. Iniciou a carreira profissional no Guarani em 1988, quando foi vice-campeão paulista ante o Corinthians de Viola. Espécie em extinção, defenderia apenas mais dois clubes ao longo de 17 anos de carreira: Bragantino (90-92) e La Coruña (92-2005).
Hoje é fácil dizer, mas na época a troca de Campinas por Bragança Paulista não parecia assim tão promissora. Afinal, Mauro vinha de uma série de contusões gravíssimas no joelho esquerdo e púbis, ambas resultando em cirurgia. Com a pecha de bichado, foi trocado com o Bragantino, junto com mais seis jogadores, pelo anônimo Vitor Hugo. Como azar pouco é bobagem, estorou o outro joelho na quarta partida pela nova equipe.
A despeito de tudo isso, Mauro Silva revelou-se o jogador certo na hora certa no lugar certo. No cenário local, Luxemburgo tinha(tem?) uma grande visão do futebol e montava uma equipe competitiva. Em âmbito internacional, a seleção brasileira amargava uma fila de mais de 20 anos e digeria o fracasso retumbante da Copa na Itália. Falcão tinha sido chamado para renovar radicalmente o grupo e foi então que a janela de oportunidade se abriu diante de Mauro Silva. A primeira convocação veio em ainda 90.
Campeão Paulista, Mauro seguiu no Bragantino e foi vice-campeão brasileiro no ano seguinte sob o comando de Carlos Alberto Parreira, justamente seu técnico na copa de 94. Novamente, a sorte ajudando a competência. De quebra, faturou a bola de ouro da Placar no mesmo ano.
No final de 92, após levar a bola de prata, pintou o convite para atuar no desconhecido La Coruña. Qualquer hesitação foi superada pela ida de Bebeto no mesmo ano. O pequeno time espanhol devia mesmo estar aspirarando uma mudança de patamar.
Na Espanha a adaptação foi fácil e Mauro manteve a cadeira cativa na seleção brasileira. Enquanto o La Coruña fazia sua escalada na Espanha, Mauro sofria com a dramática classificação para a copa de 94, obtida no último jogo, contra o Uruguai no Maracanã.
Veio o mundial dos EUA, mais uma vez os ventos sopraram a seu favor, e Mauro Silva sagrou-se campeão após sete partidas e 616 minutos. Muitos atribuem a ele a solidez que permitiu ao time de Parreira viver dos lampejos geniais de Romário. Mas, capricho do destino, na final contra a Itália não foi o Baixinho quem mais se aproximou do gol. Afinal, quem não se lembra do chute de Mauro Silva, 0 gols pela seleção, que beijou a trave de Pagliuca?
Mesmo após a campanha vitoriosa, o volante preferiu permanecer no La Coruña(teve proposta do Real Madrid), onde em 13 anos conquistou seis troféus (destaque para o campeonato espanhol de 2000) e, mais do que isso, prestígio e respeito difíceis de mensurar.
Em paralelo, seguiu defendendo a seleção, conquistando a Copa América de 97 como homem de confiança de Zagalo. Por pouco não disputou sua segunda copa do mundo em 98(machucou-se na Copa Ouro e perdeu o lugar no time), e vestiu esporadicamente a camisa amarela até 2001, quando disputou as eliminatórias com Felipão e novamente vislumbrou a possibilidade de jogar um novo mundial. Segundo ele, enterrou suas chances ao pedir dispensa da Copa América de 2001.
Fora da seleção depois de 11 anos, Mauro dedicou-se integralmente ao La Coruña por mais quatro anos, deixando a equipe como segundo jogador com mais atuações pelo clube na história. Pendurou as chuteiras no dia 22/5/2005, após um jogo contra o Mallorca no Riazor, e ganhou nada menos que uma rua na cidade com seu nome. Singela homenagem.
Hoje Mauro vive em São Paulo, prestando assessoria a empresas espanholas que atuam no mercado financeiro e imobiliário. Olhando em retrospectiva uma carreira gloriosa, só se arrepende de não ter defendido o tricolor paulista, seu time de coração. Inclusive, conforme revelou à revista Trivela (número 42), seu nome é uma homenagem ao ponta tricolor Maurinho.
Ficha
Mauro da Silva Gomes
Data de Nascimento: 12/01/1968
Local de Nascimento: São Bernardo do Campo, São Paulo<>
Clubes que defendeu:
1988-1989: Guarani-SP
1990-1992: Bragantino-SP
1992-2005: Deportivo La Coruña-ESP
Principais títulos:
- Campeonato Paulista (1990)
- Copa do Mundo (1994)
- Copa do Rei (1995, 2002)
- Supercopa da Espanha (1995, 2000, 2002)
- Copa América (1997)
- Campeonato Espanhol (2000)
segunda-feira, novembro 30, 2009
Relembre o jogador - Alemão
Alemão é mineiro de Lavras, onde nasceu em 22 de novembro de 1961. Deu os primeiros passos na carreira defendendo o Fabril e aos vinte anos se juntou ao Botafogo, clube que defenderia por sete temporadas e pelo qual conquistou a convocaçao para a Copa do México. Até hoje o jogador demonstra carinho pela equipe que o projetou no futebol.
Com a exposição internacional veio a transferência para o Atlético de Madrid. Apenas 35 jogos depois o volante trocaria as touradas pela pizza para defender o ascendente Nápoli de Maradona. A escolha se mostrou acertada, pois a equipe era muito competitiva, acabara de conquistar o scudetto na temporada 86-87. Iniciava-se ali uma era de ouro para o clube e seus principais jogadores, que desafiaram os temíveis Inter, Milan e Juventus, apimentando a histórica rivalidade entre norte e sul da Itália.
Foram dois scudetti, uma Copa da Itália e uma Supercopa da Itália. Em 1989 a superioridade do Napoli foi sentida também fora da bota. A campanha foi irretocável, com direito a duelo dramático contra a Juve nas quartas (0x2 em Turim e 3x0 em Napoli, com gol no último minuto da prorrogação), parada indigesta ante o Bayern Munique nas semis e dois jogaços contra o Stuttgart de Klinsmann na final. 2x1 em Nápoles e 3x3 em Stuttgart, com direito a gol de Alemão. A fase era ótima e cerca de dois meses depois o jogador ganharia a Copa América pela Seleção Brasileira.
Veio a conturbada Copa de 90 e a eliminação ante a Argentina do colega Maradona. Na época chegou a circular o rumor estapafúrdio de que Alemão teria aliviado a marcação em Maradona, suspeita totalmente descartada pelo volante. Encerrava-se ali um ciclo de 40 jogos e seis gols pela seleção canarinho.
De qualquer modo, a eliminação da Itália pela Argentina de Maradona pode sim ter impactado a carreira de Alemão. Há quem diga que a queda da Azurra desencadeou as investigações e intrigas que expuseram o doping de Maradona, acentuando a crise do Napoli e pondo fim ao ciclo vitorioso da equipe.
Alemão resistiu até 92, quando se transferiu para o Atalanta. Mais duas temporadas no calcio e despedida da Europa: era hora de voltar ao Brasil para defender as cores do São Paulo. A entresafra na era pós-Telê Santana fez com que a passagem de Alemão pelo tricolor não fosse vitoriosa como a de outros veteranos como Falcão e Cerezo.
A carreira entrava em queda livre e a próxima parada foi o Volta Rendonda, última equipe defendida pelo volante. Ele passou a atuar como procurador de jogadores e, a partir de 2007, seguiu o tradicional caminho de treinador, dirigindo o Tuynambás de Juiz de Fora pela segunda divisão mineira.
Em 2008 Alemão treinou o América Mineiro no módulo II do campeonato regional, de onde saiu em setembro para fazer estágios de treinador no Napoli e Reggina. Quer agregar teoria à experiência que teve com nomes como Zico, Maradona, Careca, Romário, Parreira e Telê Santana.
Recentemente deu declarações demonstrando confiança no trabalho dos ex-colegas Dunga e Maradona à frente de suas seleções nacionais. A despeito da suada classificação dos hermanos, Alemão aponta a Argentina como uma das favoritas para vencer o mundial da África.
Ficha
Ricardo Rogério de Brito
Data de Nascimento: 22/11/1961
Local de Nascimento: Lavras, Minas Gerais<> Clubes que defendeu:
1980-1980: Fabril-MG
1981-1987: Botafogo-RJ
1988-1988: Atlético de Madrid-ESP
1988-1992: Nápoli-ITA
1992-1994: Atalanta-ITA
1994-1996: São Paulo-SP
1996-1996: Volta Redonda-RJ
Principais títulos:
- Copa UEFA (1989)
-Copa América (1989)
- Supercopa da Itália (1990)
-Campeonato Italiano (1990)
- Recopa Sul-Americana (1994)
-Copa Conmebol (1994)
domingo, outubro 25, 2009
Heleno e Kaká
- Bem sei que tu não és de falhar na hora H, mas com este drink tua festa só acabará na 3ª-feira.
Sem pestanejar, o craque aceitou a sugestão. Dentro do quarto, a festa ia de vento em popa, quando Heleno sentiu uma tontura repentina. Com o teto insistindo em girar, deitou-se no sofá da suíte e começou a dizer coisas sem nexo. Aos poucos a voz da mulherada começou a soar distante.....distante.....distante........
- Opa, que lugar é este? Que calor dos infernos é este?
- Se já sabe, por que pergunta?
- Carnaval em julho? Que fantasia ridícula é essa, chifrudo? Qual é a do garfo?
- Heleno, pelo amor de Lúcifer, respeite o Satanás. Acalme-se e escute o que tenho a lhe dizer. É pelo bem do futebol.
- Hum....sujeitinho arrogante. Mas, se tem a ver com futebol, tenho interesse em ouvir.
- Rapaz, algo terrível acontecerá com a nossa paixão e só você pode nos salvar. Dentro de meio século os jogadores de futebol estarão radicalmente transformados.
- Em que sentido? Imagino que pra melhor, pra frente é que se anda.
- Para pior, muito pior. Haverá uma maldição batizada de “politicamente correta”, praga de uma era conhecida como profissionalismo, e figuras como você entrarão em extinção.
- Politicamente o quê?
- Silêncio. O profissionalismo irá pasteurizar o futebol. Esqueça as brigas, olvide os porres homéricos, imagine o fim das algazarras.
- Só de pensar me dá um calafrio.
- Eu sei. Tenho refletido muito a respeito e acho que podemos alterar o curso da história.
- Simpatia, com todo o respeito. No ritmo que eu ando, não agüento mais cinco anos. Que dizer cinqüenta...
- Quieto, petulante. Leia as instruções que eu preparei e entre naquele caldeirão sem me questionar. Já perdi muito tempo com você, estou com a agenda cheia hoje.
Madri, 24 de agosto de 2009. Kaká estaciona seu carro na Cidade Desportiva, quinze minutos adiantado para o treino do Real.
- Ei, bela máquina. No meu tempo o salário não dava nem pro pneu.
- Kaká encara o desconhecido e pergunta: desculpe, eu lhe conheço?
- Ainda não, mas estou aqui pra te salvar. Tá vendo a loira e a morena no carro ali? Vamos bater uma bola com elas?
- Agradeço a gentileza, amigo, mas a bola que eu vou bater é lá dentro, o professor Pellegrini já deve estar chegando. Ademais, eu sou um homem casado.
- Que papo é este de casado? Vai dizer que casou virgem também? Para com essa bobagem de treino e vamos armar uma com aquelas gostosas. É só dizer que passou mal depois, você tem reputação.
- Não, obrigado. Nunca perdi um treinamento e não será hoje. Com licença, estou quase atrasado.
- Huuuum, o mariquinha vai perder o treininho.
Frustrado, Heleno bufou, entrou no carro com as gatas e dirigiu até o primeiro motel que encontrou no caminho.
Quinze dias se passaram e Kaká compareceu a um evento de moda em Madri convidado por um patrocinador. No banheiro, foi abordado pelo funcionário que fornece papel higiênico e vende balas:
- Aceita lança-perfume?
- Você, de novo? Senhor, minha esposa está me aguardando na mesa, peço que não me incomode mais.
- Para de bobagem, até você chegar na mesa o barato já passou. Parece que nunca cheirou lança.
- Não quero soar deselegante, mas se você insistir de novo terei que acionar a segurança.
- Se chamar eu derrubo na porrada, rebateu Heleno, enquanto o craque merengue lhe deixava falando sozinho.
Nas semanas seguintes, Heleno de Freitas intensificou sua abordagem. Carnaval fora de época no Rio, rave com o Robinho em Manchester, cassino em Mônaco com o Jenson Button, despedida de solteiro com o Fenômeno, roda de samba com o Gaúcho. Nada surtia efeito com Kaká. O que ele falaria para o demônio quando voltasse fracassado e de mãos vazias? Foi então que pensou numa ultima tentativa.
Na semana seguinte o Real embarcaria para Marselha em rodada da fase de grupos da Champions. Kaká como sempre foi o primeiro a embarcar. Assim que entrou no avião do Real estranhou as saudações do piloto:
- Boa tarde, senhores passageiros. Informo que antecipamos a decolagem e que alteramos nosso destino para a Ilha de Ibiza. Apertem os cintos.
- Ei, mas só estou eu no avião, cadê o resto do time, perguntou Kaká.
- Não tem resto do time, respondeu de bate-e-pronto o comissário de bordo, a esta altura um velho conhecido do camisa oito merengue. Vodka ou gim?
A aeronave estava tripulada pelas mulheres mais lindas da Europa, que bajularam o craque brasileiro desde a decolagem até o pouso em Ibiza.
Na chegada, uma festa privada aguardava o brasileiro na mansão alugada por Heleno de Freitas. Cercado de beldades, com um banquete repleto de iguarias, bebidas a perder de vista e trilha sonora perfeita, Kaká não resistiu àquela infinidade de tentações e pecou. Pecou sem dó.
No dia seguinte, ele acordou despertado pela ressaca, etílica e moral. Correu pra internet e viu no site do Ás: “Kaká perde vôo e preocupa comissão do Real. Caroline desconhece seu paradeiro”.
Completamente desorientado, o craque refletiu por quinze minutos e decidiu ligar para seu mentor à procura de uma palavra de sabedoria.
- Leo, é o Kaká. Preciso da sua ajuda, toma um vôo pra cá assim que você puder.
Sem entender nada, Leonardo aterrissou em Ibiza e rumou pra tal mansão. Boquiaberto, ouviu a história de Kaká e prometeu tirá-lo dessa fria. Desenharam um plano, escolheram os jornalistas que procurariam e bolaram todas as justificativas. Neste meio tempo, o Ás já tinha trocado sua manchete: “Nem Robinho desapareceu por tanto tempo. Ainda bem que não compramos Kaká, afirma Sulaiman Al-Fahim”.
Leonardo e Kaká deixavam a casa quando Heleno voltou.
- Os senhores estão de partida? Já vão, tão cedo?
- Sim, o Kaká tem compromissos contratuais e é meu dever como mentor levá-lo de volta a Madri.
- Kaká, meu chapa, vou ser bem sincero contigo. Tu és jovem, rico, talentoso e famoso. Se não curtir a vida agora, não vai ser com sessenta anos que vai aproveitar.
- Kaká, não dê ouvidos a ele. É por causa desta mentalidade que nós brasileiros somos tão mal vistos na Europa. Mostre a eles que você é diferente.
- Diferente? Romário, Ronaldo e Ronaldinho sabiam conciliar os golaços no campo com os outros marcados fora dele. Por que você não conseguiria?
- Prazeres? Como você explicaria estes prazeres para a UNICEF e para as crianças da África que dependem de você? Pense nos contratos, nos patrocinadores. Pense na família.
- OK, já entendi a lavagem cerebral do nosso amiguinho do Milan. Pode levá-lo. A única coisa que me parte o coração é que vocês perderão o campeonato aqui em casa hoje à tarde, terei que escalar o motorista e o mordomo.
Neste momento chega uma van abarrotada de modelos, que entram em polvorosa quando vêem que Leonardo também está na casa. O tumulto toma conta do lugar, a festa começa e é difícil descrever o que ocorre nas vinte horas que se seguem.
No dia seguinte, finalmente Leonardo e Kaká embarcam no jatinho. Abraçado ao craque e ao técnico, Heleno ordena ao piloto:
- Escala rápida no Rio pra pegar o Adriano. O Berlusconi espera a gente hoje à noite na Sardenha e não podemos furar com o homem.
domingo, agosto 23, 2009
Relembre o jogador - Super Ézio
E agora, quem poderá socorrer o tricolor? Uma alternativa seria recorrer a um super herói que passou pelas Laranjeiras entre 1991 e 1995 e atende pelo nome de Ézio Leal Moraes Filho.
Super Ézio é um capixaba de Ponte de Itabapoana e completou 43 anos no último dia 15 de maio. Iniciou a carreira como ponta esquerda no Bangu em 1986, fazendo dupla com o centroavante Fernando, que passaria por Inter e Flamengo. De Moça Bonita se transferiu para o Olaria três anos depois.
Após breve passagem pelo Olaria, atuou pelo Americano de Campos antes de defender as cores da Portuguesa de Desportos entre 1990 e 1991. Não agradou e foi devolvido ao Bangu, detentor de seu passe. Foi então que sua carreira mudou de patamar.
Em 91, Ézio chegou ao Fluminense acompanhado de Bobô, egresso de passagem mal sucedida pelo São Paulo. Estreou com dois gols diante do Palmeiras e caiu nas graças da torcida. Naquele ano venceria a Taça Guanabara, feito igualado em 93, e no ano seguinte seria artilheiro do estadual com 15 gols.
A carreira de Ézio esteve perto de decolar na Copa do Brasil de 92. O tricolor chegou à final contra o Inter, venceu nas Laranjeiras com gol dele, mas caiu no Beira Rio com pênalti polêmico assinalado por José Aparecido de Oliveira e convertido por Célio Silva. Naquele momento Super Ézio disse adeus à disputa da Libertadores.
A identificação com o tricolor era forte e Ézio revela ter assinado contratos em branco e prometido não deixar o clube antes de conquistar um título, tudo em nome da paixão pelo clube. Ironicamente, o título viria em 95 quando Ézio não passava por uma boa fase e estava afastado da equipe titular. Sob o comando de Joel Santana e com gol de barriga de Renato Gaúcho contra o Flamengo de Romário e Luxemburgo em pleno ano de centenário, o atacante conquistava o único título expressivo de sua carreira.
Terminava ali uma história de cinco temporadas, 236 jogos, 118 gols, 12 deles contra o Flamengo. Super Ézio é o 8º maior artilheiro da história do Fluminense, segundo com mais gols em Brasileiros pelo clube e, atrás apenas de Assis, maior carrasco tricolor do Flamengo.
Novamente a sorte flertou com Ézio, mas seu pão caiu com a manteiga pra baixo de novo. A despeito de uma oferta do Palmeiras Parmalat para substituir Evair, o atacante acabou se transferindo para o Galo para nunca mais repetir o futebol dos anos tricolores. Com problemas no joelho, Super Ézio foi para a Inter de Limeira e ainda passou pelo CFZ e pelo Rio Branco-ES antes de pendurar as chuteiras.
Casado com a ex-body boarder botafoguense Isabela Nogueira e pai de gêmeos, Super Ézio agora divide seu tempo entre o Rio e Espírito Santo e faz seus gols no ramo de construção civil e decoração, administrando uma empresa familiar. Aspira uma posição de olheiro no Tricolor, mas nada de concreto.
Nas horas vagas, faz dupla de futevôlei na praia do Recreio com outro super herói: Jairzinho, o Furacão da copa de 70.
Ficha
Ézio Leal Moraes Filho
Data de Nascimento: 15/05/1966
Local de Nascimento: Ponte de Itabapoana, Espírito Santo<> Clubes que defendeu:
1986-1989: Bangu-RJ
1989-1990: Olaria-RJ
1990-1990: Americano de Campos-RJ
1990-1991: Portuguesa-SP
1991-1995: Fluminense
1995-1996: Atlético-MG
1996-1997: CFZ-RJ
1997-1998: Inter de Limeira-SP
1998-1998: Rio Branco-ES
Principais títulos:
- Taça Guanabara (1991/1993)
- Campeonato Carioca (1995)
segunda-feira, julho 27, 2009
Relembre o jogador - Mark Fish
Fish nasceu em 14 de março de 74, em Cape Town. Portanto, mesmo sendo branco, conheceu o Apartheid de perto. Foi criado pela mãe e pelo padrasto em um pequeno apartamento. Do alto de seu 1,91m, iniciou a vida futebolística em Pretoria como atacante no amador Arcadia Sheperds.
Aos 17 anos Fish foi descoberto pelo técnico Roy Matthews e levado ao Jomo Cosmos, onde se profissionalizou, ainda como centroavante. De olho no grandalhão, Matthews fez dele um zagueiro central, posição em que atuaria até a aposentadoria. A carreira ia de vento em popa e apenas três anos depois veio a transferência para um clube maior, o Orlando Pirates.
Foi nos Pirates que o zagueiro possivelmente alcançou seu auge. O treinador era Mike Makaab e eram tempos abundantes em troféus, com o título sul africano em 94, o bi nacional e a copa dos campeões africanos em 95 e a Copa das Nações Africanas no ano seguinte, justamente na primeira tentativa desde que a Africa do Sul fora autorizada pela FIFA, em 92, a voltar aos torneios oficiais. Em 97 o zagueiro participou da Copa das Confederações, disputada na Arábia Saudita e vencida pelo Brasil de Romário e Ronaldo. Pela seleção nacional, Fish fez 62 aparições e 2 gols.
Com tamanha exposição, a África ficou pequena para o zagueirão. Por incrível que possa parecer, Fish rejeitou um convite de sir Alex Ferguson para jogar em seu time de coração e rumou para Roma, contratado pela Lazio. Após passagem relâmpago pela bota (15 jogos e 1 gol), Mark desembarcou na terra da rainha para receber o maior salário do Bolton. A adaptação foi rápida e logo ele recebeu elogios dos companheiros e rivais, notadamente Andrew Cole. Infelizmente a sorte virou-lhe as costas e o Bolton foi rebaixado. Mesmo assim ele continuou na equipe, para delírio dos fãs.
Em novembro de 2000 Fish deixou o Bolton para jogar no Charlton, cuja camisa ele defendeu em 102 oportunidades, tendo anotado três gols. Cinco temporadas depois, um empréstimo desastroso. Jogando pelo Ipswich Town, bastaram 45 minutos para Big Fish, como ficou conhecido, romper os ligamentos cruzados, contusão que o fez pendurar as chuteiras de maneira prematura.
Após longa recuperação, Mark retornou à Africa do Sul em 2007 para tentar defender seu primeiro clube, o Jomo Cosmos. Fora de forma, não jogou uma partida sequer e reiterou a aposentadoria.
Fora das quatro linhas, Fish tem uma vida bastante midiática. Em 97, casou-se com Loui Fish, ex-modelo de langerie e socialite. Tiveram dois filhos, Luke e Zeke. Em 2006, Fish pediu o divórcio, mas logo em seguida voltou atrás. No ano passado ele entrou com novo pedido de separação e desde então o casal vive se engalfinhando nos tribunais sul africanos, para deleite dos tablóides locais.
Ao regressar ao continente negro, Fish engajou-se em diversas campanhas humanitárias, muitas delas relacionadas à erradicação da pobreza e ao desenvolvimento do futebol local, num programa para crianças de 9 a 12 anos em parceria com o Barcelona. Teve atuação destacada e bem sucedida como embaixador da candidatura sul africana para a Copa de 2010. Ou seja, Fish será figurinha carimbada nos flashs das transmissões no ano que vem.
Para aqueles que temem que a criminalidade afete o próximo mundial, vale lembrar que em agosto passado a casa de Fish em Mooikloof foi invadida e roubada por cinco homens armados (incluindo uma AK-47). Apesar de Loui e Luke Fish estarem na casa, felizmente ninguém ficou ferido.
Ficha
Mark Fish
Data de Nascimento: 14/03/1974
Local de Nascimento: Cape Town, África do Sul<> Clubes que defendeu:
1991-93: Jomo Cosmos
1994-96: Orlando Pirates
1996-97: Lazio (ITA)
1997-2000: Bolton (ING)
2000-05: Charlton (ING)
2005: Ipswich (ING)
2007: Jomo Cosmos
Seleção:Jogos: 62Gols: 2Principais títulos: - Campeonato Sul Africano (1994 e 1995) - Copa dos Campeões da África (1995) - Copa Africana de Nações (1996)
domingo, julho 26, 2009
Relembre o jogador: Dahlin
Uma das estatísticas mais intrigantes envolvendo as Copas do Mundo é aquela segundo a qual pelo menos um dos quatro semifinalistas da última edição sequer se classifica para a próxima. Tem sido assim, de maneira ininterrupta, desde 86, e tudo indica que será assim em 2010, dado o tremendo esforço que Portugal de Carlos Queiroz tem feito para manter a tradição.
Onze anos atrás coube à Suécia manter o tabu. Quatro anos antes, os suecos, liderados por Thomas Brolin e Kennet Anderson, surpreenderam o mundo ao ficarem com o terceiro lugar na Copa dos EUA. Mas aquele time tinha mais que Brolin, Anderson e Larsson. Tinha Martin Nathaniel Dahlin.
Filho de um músico venezuelano de origem africana e de uma psicóloga sueca, Dahlin nasceu em 16 de abril de 68 e foi batizado em homenagem a Martin Luther King, assassinado doze dias antes em Memphis. Apesar de ter nascido em Uddevalla, foi em Lund que ele passou sua infância. Aos dez anos ficou maravilhado diante dos gols de Kempes na copa de 78 e decidiu seguir carreira profissional.
A carreira de Dahlin teve um início tardio (ao menos para os padrões atuais) e um fim prematuro (para qualquer padrão). Ele iniciou sua carreira no Malmo, clube que defendeu entre 1988 e 1991 e onde fez 39 gols em 79 jogos. Sem perder tempo, em seu primeiro ano como profissional o atacante foi convocado para a seleção sueca. Teve seu primeiro encontro com Romário nas olimpíadas de Seul. Quatro anos depois lá estaria Dahlin, disputando a semifinal da Euro-92.
Aos 23 anos o promissor atacante brigou com o Malmo e foi negociado com o Borussia Mönchengladbach, onde permaneceu por cinco temporadas, sendo vice-campeão da copa da Alemanha em 92 a faturando o mesmo troféu em 95, ao lado de Effenberg. Em 93, fora eleito o jogador sueco do ano. Em grande forma, recebeu convite do Everton para ganhar 50% a mais. Rejeitou, pois preferia jogar na Itália ou na Espanha.
1994 foi “o” ano da carreira do jogador. Tudo conspirou para o sucesso da seleção em solo americano: o time era forte, o ambiente era bom e o estilo de jogo encaixava contra o adversário mais difícil, vide o empate na primeira fase e derrota suada para o Brasil na semifinal. Inspirado, Dahlin foi às redes quatro vezes, contra Camarões, Rússia(2) e Arábia Saudita. Além disso, contribuiu com três assistências. De quebra, tamanha semelhança com o ex-jogador de futebol americano O.J. Simpson lhe rendeu o apelido de O.J.
As boas atuações pela seleção e pelo Borussia despertaram o interesse da Roma, para onde Dahlin rumou na temporada 96-97. Contrariando as expectativas, sua passagem pela bota foi relâmpago e decepcionante: três jogos, nenhum gol e passagem de volta para o Borussia. Interessado em disputar um campeonato de primeiro nível, Dahlin teve uma boa temporada na Alemanha e conseguiu uma transferência para o Blackburn Rovers.
Na Inglaterra o atacante manteve o bom futebol e anotou quatro gols em dezenove jogos disputados na temporada 97-98. A temporada seguinte foi decisiva, negativamente, em sua carreira. Uma contusão durante um treino fez com que ele disputasse apenas cinco jogos. Posteriormente, o Blackburn envolveu-se numa controvérsia com a seguradora em torno do reembolso pela contusão do atleta, em caso que teve idas e vindas e culminou em decisão contrária ao clube, que teve que arcar com a bagatela de 4 milhões de libras.
Sendo pouco aproveitado, transferiu-se para o Hamburgo em 1999, onde atuou por uma temporada até anunciar sua prematura aposentadoria, em decorrência da contusão sofrida nos tempos de Blackburn. Encerrou, desta forma, uma bem sucedida carreira, marcada por 123 gols em 267 jogos.
Após pendurar as chuteiras, Dahlin se tornou empresário de jogadores. Representa, entre outros, Markus Rosenberg (Werder Bremen), Ola Toivonen (PSV), Behrang Safari (Basel), Jonas Olsson (West Brom) e Matias Concha (Bochum). Além disso, é dono da marca de roupas, a “Dahlin” (http://www.dahlin.nu/).
Recentemente Dahlin declarou-se um grand fã de Ibrahimovic. No entanto, evitou classificar o craque como o melhor sueco de todos os tempos. Ele diz não gostar de comparar jogadores de gerações diferentes e lembrou de Gunnar Nordahl, artilheiro da Série A por cinco temporadas seguidas nos anos 50. Comparações à parte, o certo é que Dahlin escreveu seu nome na história das Copas.
Ficha
Dahlin
Data de Nascimento: 16/04/1968
Local de Nascimento: Udevalla, Suécia <> Clubes que defendeu:
1988-1991: Malmo-Suécia
1991-1996: Borussia Mönchengladbach-Alemanha
1996-1997: Roma-Itália
1996-1997: Borussia Mönchengladbach-Alemanha
1997-1998: Blackburn Rovers-Inglaterra
1998-1999: Hamburgo-Alemanha
Seleção:Jogos: 33Gols: 20Principais títulos: - Copa da Alemanha (1995)
segunda-feira, julho 20, 2009
Era uma vez em Nasseia
- Ué, Fabinho, mas da última vez você disse que seu primo fez o gol do título de letra
- Você deve estar se confundindo
Fabinho era o menino rico da paupérrima Nasseia, interior do Piauí. Ainda fora das ondas do rádio, Nasseia confiava na família de Fabinho, dona do único jornal da cidade, para saber o que ocorria fora de suas fronteiras. Como quatro em cinco nasseios não sabiam ler, Fabinho praticamente narrava a história do pequeno povoado. Como seis em cinco nasseios eram apaixonados por futebol, não chega a causar estranheza o fato de várias das histórias do guri gravitarem em torno do universo futebolístico.
Foi por intermédio de Fabinho que Nasseia ficou sabendo do jogaço disputado entre Brasil e Polônia na copa de 38, em que Wilimowski marcou quatro vezes e Leônidas anotou sem chuteira. O menino jura de pé junto ter sido carregado nos ombros por Domingo da Guia durante as comemorações.
Além de porta-voz dos acontecimentos externos, Fabinho era generoso nos relatos de causos domésticos. Ninguém esquecia os 1487 gols anotados por Nhô Fernando, avô do menino e fundador do Correio de Nasseia. Ou do tio Adriano, que em viagem a São Paulo ensinou a Leônidas como aplicar uma bicicleta Feito este que fez de titio o presidente do Nasseia Futebol Clube, justamente na época da inolvidável excursão que a equipe fez a Milão para enfrentar a Inter de Giuseppe Meazza em 39. As fotos foram roubadas por ciganos búlgaros em Trieste, mas há quem jure ter visto os ingressos do embate.
Era impressionante a variedade de assuntos dominados pelo pimpolho. Fabinho sabia tudo de rádio, de xadrez, de peão, de bafo, de armadilha para pegar tatu, de buraco em banheiro pra ver menina pelada, de esconderijo no mato e de futebol de botão. Justiça seja feita, o menino era um ás com estas fichinhas. De acordo com o Correio de Nasseia, Fabinho vencera seis dos últimos sete campeonatos piauienses nas modalidades pré-mirim, mirim e infantil.
Tamanho sucesso levou o menino a se arriscar nas peladas da cidade. Rápido, ambidestro, criativo e dotado de instinto goleador, impressionou a todos logo de cara. Passou a jogar com meninos dois anos mais velhos e mesmo assim fazia deles gato e sapato.
Dez meses após arriscar suas primeiras embaixadas, Fabinho reforçou o Nasseinha, tradicional saco de pancadas do campeonato local. Fez a diferença e se tornou um divisor de águas no sertão piauiense. Anotou oito gols em sete jogos e levou o Nasseinha ao título inédito. Coberto de glórias, foi convocado para a seleção estadual.
A ascensão foi meteórica e quando abriu os olhos Fabinho tinha levado o Piauí à final contra o Rio de Janeiro, após atuações de gala contra gaúchos nas quartas e paulistas nas semifinais. O primeiro jogo da decisão foi disputado na capital do país e, sob um verdadeiro dilúvio, os pequenos heróis piauienses seguraram um inacreditável 0x0 em São Januário. Descrente de qualquer possibilidade de hospedar um jogo desta magnitude, a prefeitura de Teresina nem se preocupara em providenciar um estádio, o que causou um deus nos acuda às vésperas da decisão. Após verdadeiro mutirão entre os sertanejos, a pequena Picos foi eleita para receber a finalíssima.
Ironicamente, tamanho esforço foi quase em vão para os nasseios. Os 400 quilômetros que separavam Nasseia de Picos eram quilômetros demais para que os locais pudessem prestigiar seu ídolo mirim. Alheio a tudo isso, o garoto comeu a bola. Em jornada inspirada, Fabinho foi às redes duas vezes, de falta e de cabeça. Os cariocas tinham mais time e empataram o duelo a quatro minutos do fim. O balde de água fria não abateu a seleção do Piauí, que entrou compenetrada na prorrogação. O lance decisivo foi narrado assim por Fabinho aos seus amigos alguns dias depois, no banco da praça de Nasseia:
- O Jaime bateu o tiro de meta curto pra mim. Quando veio o primeiro, enfiei entre as canetas. Disparei e levei o segundo com um drible da vaca. Cruzei a linha do meio de campo e passei no meio de dois. A bola começou a quicar e tirei o volante deles com um chapéu. O zagueiro veio, joguei na frente e, antes de fazer o gol, fintei o goleiro com um drible de corpo. Logo na saída de bola dos cariocas o juiz apitou e ficamos com o título.
O ambiente foi tomado por gargalhadas:
- Fabinho, pelo amor de deus. De todas as suas mentiras, esta consegue ser a mais ridícula. E olha que isto é muito difícil. Ou alguém aqui conhece história de jogador que driblou sete adversários antes de fazer, no final da prorrogação, o gol do título? Não me leve a mal, mas acho mais fácil acreditar naquela do seu tio baixando as calças do Mussolini no estádio do que numa baboseira dessas.
Devastado e sob uma saraivada de risadas, o menino afastou-se e foi jogar futebol de botão contra si mesmo.
A centenas de quilômetros dali, numa roda, quatro garotos jogavam peão e ouviam atentamente um deles contar o que parecia ser um feito e tanto:
- Quando ele colocou na frente, vocês precisavam ver o goleiro se estatelando com o zagueiro. Foi o gol mais lindo que eu vi na minha vida.
segunda-feira, junho 01, 2009
O agnóstico
Eram anos estéreis em termos de conquistas para a seleção canarinho e, como se sabe, fé e dificuldade andam de mãos dadas. Avizinhava-se a Copa da Itália e ele, do alto de seus dez anos, percebia que algo não ia bem entre os comandados de Lazaroni, talvez em decorrência do episódio em que os jogadores cobriram a marca da empresa patrocinadora em algumas fotos. Lamentou quando viu o cruzamento das oitavas de final e assistiu ao jogo na companhia de mais de trinta convidados que sua mãe convidara para uma festa em casa. Considerou tudo aquilo um sacrilégio, copa do mundo era coisa séria demais pra ser assistida em meio a Ray Conniff, Camparis e canapés. No fundo, sabia que o Brasil passava por uma entressafra de talentos.
Três anos se passaram e vieram as famigeradas eliminatórias e o fantasma da eliminação diante do Uruguai no Maracanã. Nosso guri era então adolescente e encantou-se com a rebeldia de Romário, que esbanjou genialidade e colocou o Brasil na copa. Começava ali uma admiração que transcendia a relação ídolo-fã.
Prometera levar a copa mais a sério e assim o fez. Leu todos os guias de cabo a rabo, assistiu a todos os jogos e acompanhou o escrete com devoção total. Antes dos jogos, rezava e fazia promessas. Depois, pagava-as com juros e prontidão. Acreditava piamente que a fé do povo, a começar pela sua, traria o caneco depois de longos 24 anos. Curiosamente, jamais flertou com a superstição, esta prima distante da religião.
A conquista, da maneira hercúlea como aconteceu, corroborou a certeza de que reza ganha jogo. Romário, como ele suspeitava, era mesmo o Messias que surgira da Vila da Penha para redimir o país do futebol. Jamais se esqueceria de sua mãe rezando no terraço enquanto Taffarel entrava em ação no Rose Bowl.
Entre os catorze e os dezoito anos, tempos confusos. Fora de campo ele leu muito e adquiriu convicções socialistas, segundo as quais a religião é o ópio do povo. Leu Descartes, que explicou matematicamente a existência de Deus. Leu Darwin, Nietzsche e Freud, acusados de serem os assassinos de Deus. Dentro de campo, passou a jogar em nível mais competitivo. Quando se contundia, rezava para acelerar a recuperação. Antes dos grandes jogos, fazia promessas, invariavelmente cumpridas depois. Ficava nebulosa a fronteira entre força mental e fé, possivelmente sinônimos. No fundo, ainda acreditava.
Foi quando pediu, como presente por ter entrado na faculdade, para assistir ao mundial da França in loco. 94 lhe enchera de esperança e tudo indicava que Romário e Ronaldo levariam o Brasil ao penta. O corte do primeiro o levou aos prantos em público, diante da coletiva em que o Baixinho, o Messias, chorou como criança. Ronaldo voava baixo e haveria de honrar o genial parceiro de ataque.
O time era instável e ele retomou a rotina de rezas e promessas. Chile, Dinamarca, Holanda, este o jogo mais sensacional de sua vida. A vitória nos pênaltis confirmava a força da fé. Naquela noite, quadruplicou as promessas tendo em vista o duelo de 12 de julho.
Vieram o desastre, a humilhação e a decepção. Diante da maior tristeza de sua vida, voltou ao hotel e simplesmente concluiu que Deus não existia. Mandou as promessas, o terço e a fé às favas e converteu-se ao agnosticismo.
A copa da Ásia de certa forma vitaminou a aversão adquirida quatro anos antes. Afinal, ele viu a família Scolari ganhar os sete jogos de junho sem a necessidade de uma ave-maria sequer. Na final, encontrou-se com os amigos num churrasco e, como que extravasando o rancor de Saint Denis, apontou para Ronaldo no vídeo e vociferou diante dos quarenta convidados presentes: “este cara fez mais por mim do que Jesus”.
Algumas pessoas acreditam num fenômeno chamado de “crise de um quarto da vida”, que costuma acometer as vítimas em torno dos vinte e cinco anos de idade. Nosso personagem parece ter passado por ela. Após os 24 anos, sentiu-se mais maduro e começou a olhar a vida de outra forma, incluindo o futebol. Isto não impediu que sofresse a habitual “tensão pré-copa”, quando a contagem regressiva para o torneio da Alemanha culminou numa ansiedade insuportável. Em meio ao choque de realidade, percebeu o oba-oba que reinava no grupo de Parreira e lembrou-se de outro oba-oba, aquele na sala de sua casa dezesseis anos antes.
Consumiu avidamente o torneio, e salivou diante do prato frio da vingança a ser saboreado nas quartas de final. Sucumbiu diante de Zidane, chorou que nem criança novamente e, num momento de reflexão, percebeu que religião e futebol são um fenômeno da mesma natureza, que atendem a mesma necessidade humana, mas que não, Deus não é o menino do placar.
Recentemente nosso amigo esteve na Índia e desde então tem dedicado um bom tempo contemplando o Cristo Redentor. Inveja as pessoas de fé e voltou a pensar em Deus, desta vez sem chuteiras. Aposta suas fichas na Argentina na copa da África e sonha em ser campeão do mundo em um Maracanã lotado.
domingo, maio 17, 2009
Resenha Guia Placar Brasileiro 2009
Para dar uma mãozinha, o formato de pontos corridos parece se consolidar e deixar o planejamento mais fácil, seja para os clubes, que finalmente começam a vender pacotes de ingressos para os jogos em casa, seja para a mídia, que aprimora a cobertura do torneio.
Some-se a isso o fato de, conforme comentado neste espaço algumas vezes, o mercado editorial em torno do futebol ter evoluído significativamente nos últimos dez anos. Os guias do campeonato brasileiro dão uma boa dimensão disso, com mais variedade e concorrência em 2009. Foi neste terreno fértil e competitivo que a revista Placar lançou seu tradicional guia do campeonato brasileiro.
Incomodada por concorrentes diretos como Lance e Globo Esporte, a publicação traz algumas inovações gráficas, detalhes como autógrafo digitalizado dos jogadores e legendas para indicar destros e canhotos. Isso tudo sem abrir mão da habitual enxurrada de informações. De fato o material é riquíssimo em detalhes e estatísticas, cobrindo as três principais divisões do nosso futebol.
Completo por um lado, mal revisado por outro. Para uma publicação deste gabarito, o guia vem repleto de erros banais (perdi a conta após o 20º), contradições e descuidos, via de regra envolvendo dados históricos, mas também abrangendo aberrações como trocar o escudo do Vitória pelo do São Paulo. O leitor detalhista, perfeccionista ou de boa memória certamente ficará incomodado. O mais afeito a números e estatísticas consistentes, sairá desconfiado ou até mesmo descrente.
Além de ter negligenciado os detalhes de seu guia, Placar traz um material excessivamente sério e de certa forma carente de análises. Tivesse se aprofundado na parte tática, inserido um pouco mais de opinião ou temperado a edição com algumas pitadas de humor, a revista faria ainda mais sucesso. Outra desvantagem, esta tão cruel quanto verdadeira, é a desatualização, por motivos óbvios e compreensíveis, frente aos guias em formato digital publicado por sites e blogs.
Em suma, o guia atinge o objetivo de informar, com extrema riqueza de detalhes, os torcedores interessados em saber mais sobre o campeonato brasileiro. É completo, abrangente e graficamente interessante. No entanto, a recente sofisticação do mercado editorial relacionado ao futebol eleva o nível de exigência do leitor. Não basta mais recauchutar formatos e conteúdos de anos anteriores, apostando em sucessos do passado. Placar deve estar atenta a isso se quiser manter seu domínio na publicação de Guias do Brasileirão.
domingo, abril 05, 2009
“20 anos da Copa do Brasil”
O torneio é pródigo em pelo menos três aspectos: seu caráter democrático; as zebras homéricas que permeiam sua história, típica de um mata-mata; e os causos inusitados que o cercam, muito em razão de ser disputado frequentemente nos grotões do país. Pois bem, o livro de Migueres e Escobar explora razoavelmente bem o primeiro aspecto, enquanto o segundo e o terceiro são, de certa forma, negligenciados. O próprio subtítulo, “De Kaburé a Cícero Ramalho” gera uma expectativa, em torno das excentricidades do torneio, que acaba não correspondida.
Mesmo com essas ressalvas, o livro reflete um trabalho intenso de pesquisa dos autores. A parte sobre clubes que disputaram o torneio e hoje não existem mais merece destaque. Curiosamente, um dos exemplos utilizados, o Malutrom-J.Malucelli está se convertendo em um terceiro, o Corinthians Paranaense. O levantamento acerca das mascotes dos participantes segue a mesma linha de pesquisa minuciosa com resultados interessantes, assim como a escalação dos atletas com nomes e/ou apelidos mais bizarros de cada edição.
Já a lista dos artilheiros do torneio, estrelada por nomes como Bizu, Dauri e Victor Simões, é muito mais exótica do que a do Brasileirão. Há observações interessantes, como o fato do critério de desempate pelos gols anotados fora de casa, original de fábrica do torneio, ter sido copiado por primos ricos como a Liga dos Campeões. Ou pelo ineditismo da decisão por pênaltis na finalíssima, mesmo após 20 edições.
O livro prima também pela alta qualidade presente em sua apresentação gráfica, comprovada pelas imagens utilizadas, que quebram um pouco o gelo e emprestam informalidade à obra. O senso de humor carioca dos autores também colabora para isso.
Com relação às zebras e aos causos pitorescos envolvendo o torneio, o livro é extremamente superficial e burocrático, optando por listar inúmeros casos, vários irrelevantes, em vez de se aprofundar no lado mais insólito da competição. Impossível não comparar com a excelente série de reportagens produzida recentemente pela ESPN Brasil (“O Brasil da Copa do Brasil”).
As estatísticas apresentadas repetem o tom frio e burocrático presente ao longo do livro. Em vez de dar destaque, por exemplo, aos 49 gols sofridos pelo Operário-MS em cinco jogos, os autores despejam uma infinidade de números que poderiam meramente constar no final do livro para consulta.
Em suma, o livro está longe de ser ruim, mas em nenhum momento prende o leitor. O que é uma pena, pois estamos falando de um torneio rico em emoção (preenche a lacuna dos campeonatos disputados em formato eliminatório), e repleto de histórias a serem contados Fica a impressão de que uma grande oportunidade poderia ter sido mais bem aproveitada.